Iniciativas evitam o desperdício e comida que iria para o
lixo alimenta mais de 1,6 milhão de brasileiros
Mais de 100
iniciativas evitam o desperdício e ajudam a combater a fome no Brasil. Sobras
próprias para consumo são recolhidas em feiras e centrais de abastecimento e
distribuídas em instituições e comunidades.
O trabalho deste grupo começa quando o fim da feira se aproxima: Daniel
Ferratoni e Lucila Matos espalham contêineres entre as barracas para recolher
frutas, verduras e legumes que iriam para o lixo. Eles são idealizadores do
Banco de Alimentos de Santos, no litoral norte paulista, uma organização focada
em combater o desperdício e distribuir esses alimentos em comunidades em
situação vulnerável.
Todas as quartas-feiras, Daniel, engenheiro, e
Lucila, formada em relações internacionais, recolhem em torno de 200 quilos de
comida. “Os feirantes separam para a gente principalmente talos e folhas de
alimentos, como brócolis e cenoura, que o cliente não leva na hora da compra”,
diz Daniel. “Mas também recolhemos caixas fechadas de frutas e vegetais mais
perecíveis que eles não conseguem vender”, completa.
“Gosto de ajudar, sei que essa comida mata a
fome de muita gente”, diz Lívia, feirante há 22 anos e uma das colaboradoras
mais fiéis. Nesta quarta-feira, a barraca dela doou vagem, jiló, chuchu,
pepino, brócolis e tomate.
Maycon Henrique, Lucila Matos, Daniel Ferratoni e Douglas Carvalho, do
Banco de Alimentos de Santos.
A iniciativa em Santos, fundada em janeiro,
buscou inspiração dentro e fora do Brasil. Lucila acompanhou o trabalho em Bonn
e Colônia, na Alemanha – um dos países pioneiros, onde mais de 900 bancos de
alimentos estão em funcionamento. “De lá, trouxemos a ideia de distribuir os
alimentos diretamente nas comunidades. Aqui no Brasil, a maioria recolhe a
comida e entrega em instituições”, conta.
Combate ao desperdício
O primeiro banco de alimentos do Brasil surgiu
em 1994, fundado pelo Serviço Social do Comércio (Sesc), em São Paulo. O
movimento, com o objetivo de combater o desperdício e a fome, se expandiu num
ritmo tímido entre as outras unidades do país, e algumas ONGs, como a Banco de
Alimentos SP e a Banco de Alimentos de Porto Alegre, foram criadas com o mesmo objetivo.
O primeiro banco de alimentos criado com verba
do governo federal surgiu somente em 2003. Atualmente, são 78, apoiados pelo
Ministério do Desenvolvimento Social e Combate à Fome (MDS). “Eles estão em
funcionamento em todas as regiões do país, em 24 estados, 16 capitais, com uma
cobertura de 60% dos municípios acima de 300 mil habitantes”, informou o MDS à
DW Brasil.
Essas regiões são estratégicas, porque
concentram grandes redes varejistas, indústrias alimentícias e centrais de
abastecimento – locais onde, segundo o ministério, as perdas e o desperdício de
alimentos são alarmantes.
Atualmente, cerca de 100 projetos funcionam no
Brasil, somando os administrados pela sociedade civil e pelo Estado. A comida
recolhida é fonte de alimento para mais de 1,6 milhão de pessoas no país,
calcula o governo federal.
Todos os anos, estima-se que 1,3 bilhão de
toneladas de alimentos bons para o consumo sejam descartados. No Brasil, um dos
maiores produtores agrícolas mundiais, esse número é de quase 27 milhões. Ao mesmo
tempo, cerca de 805 milhões de pessoas passam fome no mundo, de acordo com a
Organização das Nações Unidas para a Alimentação e a Agricultura (FAO).
Comida recolhida pelo Banco de Alimentos de Santos é distribuída entre
100 famílias da comunidade Alemoa.
Fila na hora
da partilha
Em Santos, o alimento recolhido na feira é
transportado por uma Kombi “coletiva”, usada em outro projeto social na região.
A comida é distribuída entre 100 famílias da comunidade Alemoa, bairro de baixa
renda, endereço de 970 famílias.
Na casa da líder comunitária, Maria Lúcia
Cristina Jesus Silva, as caixas coletadas são pesadas e, na sequência,
distribuídas. “Muita gente sobrevive com isso”, conta Maria, moradora da
comunidade desde 1974.
Uma hora antes da partilha, uma fila começa a
se formar. Os moradores trazem uma sacola, recebem uma senha e podem escolher o
que levar para casa. “Eu pego para mim e para minha vizinha, que está doente”,
conta Antônio, 63 anos, desempregado.
O projeto de Daniel e Lucila foi fundado a
partir de um financiamento coletivo de internautas. Eles não têm salários e
contam com oito voluntários. Maycon Henrique, de 14 anos, sempre participa às
quartas-feiras, depois que sai da escola. “Eu gosto de ajudar minha comunidade.
E sempre levo para casa alface, melancia e melão que iriam para o lixo. Minha
mãe também gosta.” (ecodebate)
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