IFPA Campus Castanhal e IEB
realizam experiências inovadoras em educação e governança no Xingu e no Oeste
paraense.
As Amazônias do Brasil são várias. Neste vasto e complexo universo, o
Pará é o segundo estado em extensão territorial, numa realidade marcada pelo
caos fundiário. O estado que é líder em desmatamento, também coleciona outros
passivos sociais e ambientais.
Apesar do ambiente, nele
pulsa uma infinidade de experiências de produção econômica, política, social e
cultural protagonizadas a partir de populações ancestrais (indígenas e
quilombolas), e do diversificado campesinato, seja em terra firme, ilhas,
quilombos, áreas indígenas, unidades de conservação e projetos de assentamentos
rurais. O uso da floresta e seus recursos de forma equilibrada, tendo como
referência a agroecologia é um dos exemplos.
Existe saber na floresta. Os
povos que nela vivem há milênios são tributários de conhecimento tratado como
tradicional, e que aos poucos vem sendo reconhecido pelo universo dito douto e
o mercado.
Educação inovadora
Numa iniciativa considerada
inovadora em governança, este ano o Instituto Federal do Pará (IFPA), Campus
Castanhal, em parceria com a ONG Instituto Internacional de Educação do Brasil
(IEB) realizaram dois cursos de Formação Inicial Continuada (FIC), o Formar
Florestal e o Formar Agroecologia. Ambos direcionados para lideranças
comunitárias e técnicos de extensão rural, visando formar e ampliar
multiplicadores, pessoas que podem repassar os conhecimentos adquiridos para a
transformação da realidade onde vivem. O primeiro contou com o financiamento do
Fundo Vale, o segundo com financiamento do Ministério do meio Ambiente.
“Num cenário regional marcado
por uma agenda de grandes empreendimentos, o manejo da floresta e a produção
agroecológica em pequena escala, acenam como uma possiblidade de
desenvolvimento, com capacidade de garantir além da cidadania, a segurança
alimentar e a sobrevivência de gerações futuras, a partir do uso racional da
floresta”, argumenta Manuel Amaral, coordenador regional do IEB em Belém.
Formar Florestal
O curso de Formação Inicial e
Continuada (FIC) em Manejo Florestal Comunitário tem como pressupostos
metodológicos, a pedagogia da alternância, a educação como afirmação,
reconhecimento, valorização e legitimação das diferenças culturais,
étnicos-raciais, de geração, de gênero, de orientação sexual e socioambiental.
O percurso formativo do curso é organizado em dois momentos: O tempo escola,
que é o espaço de formação presencial onde os educadores discutem temáticas
relevantes para a o manejo florestal comunitário e o Tempo comunidade que é o
momento dedicado a qualificação dos (as) os (as) educandos (as) nas suas
comunidades, através de intervenções práticas que foram planejadas no tempo
escola. Os tempos comunidade são tempos de ação concreta dos educandos (as) e
uma reflexão permanente acerca das questões teóricas que perpassam o curso.
O horizonte é favorecer a reflexão articulada e integrada com base nos
saberes locais e científicos estabelecidos
O Formar Florestal ocorreu
entre abril e novembro de 2014. Dividido em cinco módulos, entre eles,
Governança Florestal, Técnicas de manejo florestal, Gestão de empreendimentos
comunitários, Comunicação socioambiental e Políticas Públicas. O curso tem
carga horária de 400h. 20 educandos, entre jovens e adultos de diferentes
níveis de formação foi o público alvo.
Os educandos (as) são
oriundos de sete municípios do oeste paraense: Santarém, Belterra, Rurópolis,
Itaituba, Porto de Moz, Juruti e Trairão. As cidades irrigadas pelos rios
Tapajós, Amazonas e Xingu abrigam inúmeras unidades de conservação e
territórios indígenas além de projetos de assentamentos. As áreas tradicionais
locais enfrentam a pressão da ampliação da produção de grãos, mineração e de
projetos hidrelétricos.
Emponderar lideranças jovens
e adultas com conhecimentos sobre os aspectos técnicos, organizacionais,
políticos, culturais para fortalecer manejo florestal comunitário e a
governança florestal no Pará é o objetivo do curso. Pedagogia da Alternância é
a metodologia adotada.
Multiplicadores
Marcelane Pereira é
trabalhadora rural no município de Itaituba, reconhecida cidade garimpeira. A filha
de maranhenses aos 37 anos é mãe de cinco filhos, e já é avó de dois netos. A
moradora do projeto de assentamento Ipiranga é dirigente do Sindicato de
Trabalhadores e Trabalhadoras Rurais (STTR). Ela integrou a primeira turma do
Formar Florestal.
Sobre o contexto da região
ela dispara: “Temo pelo avanço dos grandes projetos aqui. Em particular o
crescimento da soja. A nossa cidade já sofre com os impactos por conta da
construção de portos. A cidade cresce. Aumenta a droga e a prostituição. Não
quero isso para os meus filhos e netos”.
Para Pereira a participação
no curso é positiva. Ela confirma que aplicará os conhecimentos adquiridos no
STTR e na comunidade que faz parte. “Algumas coisas a gente já fazia, o grupo
pode melhorar a produção com o que a gente aprendeu do curso” finaliza a
sindicalista.
Marcelane abandonou os
estudos por conta da distância da escola em relação à comunidade que morava, e
outras necessidades. Durante o curso voltou a estudar e promete não parar mais.
Assim como ela, Luiz da Silva Matos, morador do município de Juruti e educando
do curso, seguiu o mesmo rumo.
Formar Agroecologia
O Curso FIC em Agroecologia, agriculturas de
base ecológicas e políticas públicas, segue a mesma lógica do Formar Florestal,
através da pedagogia da alternância e a articulação dosa saberes empírico com
os saberes da academia. O foco da formação é a superação do modelo de
agricultura que degrada o meio ambiente, a partir de conhecimentos científicos
e práticos. A ideia é o compartilhamento, disseminação e construção de
conhecimentos a partir do contexto regional, que visa fortalecer a agricultura
de base ecológica.
O sul e o sudeste configuram uma das
principais fronteiras de ampliação do capital na Amazônia. Os ciclos de
exploração da madeira, gado e minério cimentaram a região como a que mais
desmata no bioma. O município de São Félix do Xingu, localizado ao sul do Pará,
ocupa o primeiro lugar do ranking. Por isso tem sido alvo de uma série de
medidas que busca reverter o quadro. A formação em agroecologia surge deste
contexto. Ao contrário do Formar Florestal, a opção dele foi o município de São
Félix do Xingu. Ele tem como objetivo formar agentes de Assistência Técnica e
Extensão Rural, além de lideranças e agricultores familiares na região. 30
educandos integraram a primeira turma.
Casa Família Rural (CFR) é um espaço de
educação voltado para a realidade camponesa. Muitas das vezes não conta com o
apoio do estado ou município para a sua manutenção. Marly Silva Araújo dirige a
CFR de São Félix há seis anos. Ela fez parte da primeira turma do curso em
agroecologia.
Em sua avaliação, a formação colaborou para
refletir sobre as práticas e conceitos em agroecologia, e que tais práticas
podem determinar o futuro dos moradores da região. Conforme Araújo, as aulas
teóricas colaboraram para o conhecimento de conceitos e avaliação das práticas
desenvolvimentos pelos agricultores.
Araújo pondera que o ponto foi alto do
processo foi o intercâmbio com agricultores do nordeste paraense. Os educandos
enfrentaram mais de mil quilômetros “Podemos conhecer práticas inovadoras de
agricultores familiares e pecuaristas. Foi possível conhecer as diferenças
entre as regiões, e o que pode ser replicado em nossa região. Ocorreu um
alargamento da nossa visão sobre produção sustentável. A CFR passou a adotar
parte do conteúdo sobre o tema”, arremata a educadora. (ecodebate)
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