Japoneses recolhem o próprio lixo após jogo de sua
seleção. Atitude dos japoneses surpreendeu a muita gente, que não possui o hábito
de recolher o próprio lixo.
Existe
praticamente um consenso no país, considerando que existe uma necessidade
premente de satisfazer adequadamente as necessidades e expectativas
educacionais do Brasil. Mal imaginavam os governantes e figuras que já declararam
que copa não se faz com escolas e hospitais, que os exemplos de japoneses nos
estádios, ou de comportamentos de alemães e holandeses dentre outros, apenas
para falar nas seleções que aqui permaneceram por mais tempo, determinaria
mudanças de paradigmas tão radicais.
Cabe a
especialistas como sociólogos ou antropólogos com maior representatividade,
discutir os significados de comportamentos dignificantes exibidos por alemães,
holandeses ou jogadores e turistas de outras nacionalidades como os
australianos. Mas o exemplo dos japoneses merece aqui ser analisado e
ressaltado. As coletas de resíduos sólidos remanescentes nos estádios após as
partidas foi alvo de comentários de enorme relevância em toda imprensa
especializada ou de caráter geral.
Uma
abordagem realizada pelo colunista de terra magazine, Altino Machado a quem
citamos e creditamos esta visão, cita o magistral dramaturgo brasileiro e
apaixonado por futebol, Nélson Rodrigues. Não lembro se foi Nélson Rodrigues ou
o poeta gaúcho Mário Quintana quem observou em tom de brincadeira que o
torcedor de futebol representava o elo perdido entre o ser humano e nossos
ancestrais símios. Mas não importa. Na crônica de Altino Machado publicada no
Terra Magazine existe a abordagem muito apropriada de que num jogo de futebol,
a bola é um mero detalhe. Ao contrário do que imaginam os membros do comitê
organizador, futebol se faz com escolas, educação e quem sabe com hospitais
capazes de satisfazer as necessidades e expectativas de nossas populações mais
necessitadas.
A bola é um
mero detalhe do espetáculo, como dizia Nélson Rodrigues. Os jogos e espetáculos
de futebol são assistidos e jogados por seres humanos e não elos perdidos. E na
medida que estes indivíduos são educados e conscientes, se tornam capazes de
desempenhar tarefas e funções inimagináveis. Nélson Rodrigues já asseverava que
o que importa é o ser humano por trás da bola. Conforme ele cita “não é a
diversão lúdica, mas a complexidade da existência”.
Os seres
humanos que representaram os torcedores japoneses, que torceram para o Japão em
Pernambuco e Natal, nos jogos que os japoneses atuaram contra Costa do Marfim e
Grécia, deram um exemplo após as partidas, recolhendo todos os resíduos sólidos
gerados. Os resíduos foram recolhidos em sacos plásticos carregados
especialmente para tal finalidade específica.
Enquanto
torcedores do Brasil e de outros países se retiravam dos estádios, deixando
acumuladas montanhas de lixo, sem sequer olhar para trás, os japoneses
ministravam uma aula de civilidade, talvez porque eu seu país, futebol se faça
com estádios, mas também com escolas e educação. Os japoneses recolhiam
discretamente garrafas e copos de plástico, papel, bandejinhas de isopor, latas
de cervejas e de refrigerantes, canudinhos, restos de alimentos, embalagens
usadas, enfim todos os resíduos sólidos produzidos durante a partida.
Este gesto
de alto significado civilizatório é uma lição de ética e cidadania e traz
inúmeras lembranças, como a do personagem Dersu Uzala, citado por Altino
Machado no Terra Magazine. O personagem criado pelo lendário diretor japonês
Akira Kurosawa é um velho e sábio habitante da taiga siberiana que estabelece
uma relação de proximidade com um oficial russo num dos mais belos filmes da
cinematografia japonesa. Ele sabe que o ser humano é apenas mais um
constituinte do mundo, tanto quanto o sol, as estrelas, a água, o fogo ou o
vento, a neve e os animais e precisa compartilhar este mundo com seus
semelhantes e os demais animais e forças da natureza.
Uma das
cenas mais comoventes do filme e lembrada por Altino Machado é quando o velho e
o jovem capitão russo dividem um abrigo durante uma noite e no outro dia antes
de partirem o velho sábio separa um pouco dos mantimentos e armazena no abrigo.
Surpreso o jovem capitão russo questiona que ambos nunca mais voltarão a este
lugar. É quando o velho ancião afirma que a partilha é para que outro indivíduo
qualquer em situação de necessidade possa se satisfazer.
Esta noção
de compartilhamento de vida é comovente e muito “existencial” como diria Nélson
Rodrigues para que possa ser confundida com uma educação que se limite a um
treinamento de procedimentos a serem decorados e não a uma profunda reflexão de
vida como se faz necessário.
Torcedores
alemães também demonstraram comportamentos análogos em alguns episódios da FIFA
Fan Fest na cidade do Rio de Janeiro e não se pode deixar de enaltecer os
exemplos resultantes não apenas de educação, disciplina ou treinamento, mas
também de profundo estágio civilizatório incutido por relevantes processos
educacionais.
Como os
japoneses, somente é possível desenvolver a ética da convivência civilizatória,
solidariedade e do desprendimento quando o contexto de cidadania é plenamente
atingido. Está é a grande lição da copa ministrada exaustivamente pelos
torcedores japoneses, em todos os lugares onde tiveram a oportunidade de se
expressar. De forma silenciosa, efetiva e eficiente em toda sua plenitude.
(ecodebate)
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