sexta-feira, 27 de março de 2015

Exemplo dos japoneses

Japoneses recolhem o próprio lixo após jogo de sua seleção. Atitude dos japoneses surpreendeu a muita gente, que não possui o hábito de recolher o próprio lixo.
Existe praticamente um consenso no país, considerando que existe uma necessidade premente de satisfazer adequadamente as necessidades e expectativas educacionais do Brasil. Mal imaginavam os governantes e figuras que já declararam que copa não se faz com escolas e hospitais, que os exemplos de japoneses nos estádios, ou de comportamentos de alemães e holandeses dentre outros, apenas para falar nas seleções que aqui permaneceram por mais tempo, determinaria mudanças de paradigmas tão radicais.
Cabe a especialistas como sociólogos ou antropólogos com maior representatividade, discutir os significados de comportamentos dignificantes exibidos por alemães, holandeses ou jogadores e turistas de outras nacionalidades como os australianos. Mas o exemplo dos japoneses merece aqui ser analisado e ressaltado. As coletas de resíduos sólidos remanescentes nos estádios após as partidas foi alvo de comentários de enorme relevância em toda imprensa especializada ou de caráter geral.
Uma abordagem realizada pelo colunista de terra magazine, Altino Machado a quem citamos e creditamos esta visão, cita o magistral dramaturgo brasileiro e apaixonado por futebol, Nélson Rodrigues. Não lembro se foi Nélson Rodrigues ou o poeta gaúcho Mário Quintana quem observou em tom de brincadeira que o torcedor de futebol representava o elo perdido entre o ser humano e nossos ancestrais símios. Mas não importa. Na crônica de Altino Machado publicada no Terra Magazine existe a abordagem muito apropriada de que num jogo de futebol, a bola é um mero detalhe. Ao contrário do que imaginam os membros do comitê organizador, futebol se faz com escolas, educação e quem sabe com hospitais capazes de satisfazer as necessidades e expectativas de nossas populações mais necessitadas.
A bola é um mero detalhe do espetáculo, como dizia Nélson Rodrigues. Os jogos e espetáculos de futebol são assistidos e jogados por seres humanos e não elos perdidos. E na medida que estes indivíduos são educados e conscientes, se tornam capazes de desempenhar tarefas e funções inimagináveis. Nélson Rodrigues já asseverava que o que importa é o ser humano por trás da bola. Conforme ele cita “não é a diversão lúdica, mas a complexidade da existência”.
Os seres humanos que representaram os torcedores japoneses, que torceram para o Japão em Pernambuco e Natal, nos jogos que os japoneses atuaram contra Costa do Marfim e Grécia, deram um exemplo após as partidas, recolhendo todos os resíduos sólidos gerados. Os resíduos foram recolhidos em sacos plásticos carregados especialmente para tal finalidade específica.
Enquanto torcedores do Brasil e de outros países se retiravam dos estádios, deixando acumuladas montanhas de lixo, sem sequer olhar para trás, os japoneses ministravam uma aula de civilidade, talvez porque eu seu país, futebol se faça com estádios, mas também com escolas e educação. Os japoneses recolhiam discretamente garrafas e copos de plástico, papel, bandejinhas de isopor, latas de cervejas e de refrigerantes, canudinhos, restos de alimentos, embalagens usadas, enfim todos os resíduos sólidos produzidos durante a partida.
Este gesto de alto significado civilizatório é uma lição de ética e cidadania e traz inúmeras lembranças, como a do personagem Dersu Uzala, citado por Altino Machado no Terra Magazine. O personagem criado pelo lendário diretor japonês Akira Kurosawa é um velho e sábio habitante da taiga siberiana que estabelece uma relação de proximidade com um oficial russo num dos mais belos filmes da cinematografia japonesa. Ele sabe que o ser humano é apenas mais um constituinte do mundo, tanto quanto o sol, as estrelas, a água, o fogo ou o vento, a neve e os animais e precisa compartilhar este mundo com seus semelhantes e os demais animais e forças da natureza.
Uma das cenas mais comoventes do filme e lembrada por Altino Machado é quando o velho e o jovem capitão russo dividem um abrigo durante uma noite e no outro dia antes de partirem o velho sábio separa um pouco dos mantimentos e armazena no abrigo. Surpreso o jovem capitão russo questiona que ambos nunca mais voltarão a este lugar. É quando o velho ancião afirma que a partilha é para que outro indivíduo qualquer em situação de necessidade possa se satisfazer.
Esta noção de compartilhamento de vida é comovente e muito “existencial” como diria Nélson Rodrigues para que possa ser confundida com uma educação que se limite a um treinamento de procedimentos a serem decorados e não a uma profunda reflexão de vida como se faz necessário.
Torcedores alemães também demonstraram comportamentos análogos em alguns episódios da FIFA Fan Fest na cidade do Rio de Janeiro e não se pode deixar de enaltecer os exemplos resultantes não apenas de educação, disciplina ou treinamento, mas também de profundo estágio civilizatório incutido por relevantes processos educacionais.
Como os japoneses, somente é possível desenvolver a ética da convivência civilizatória, solidariedade e do desprendimento quando o contexto de cidadania é plenamente atingido. Está é a grande lição da copa ministrada exaustivamente pelos torcedores japoneses, em todos os lugares onde tiveram a oportunidade de se expressar. De forma silenciosa, efetiva e eficiente em toda sua plenitude. (ecodebate)

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