“O
lema do debate sobre população e desenvolvimento no século XXI deveria ser:
menos gente, menos consumo, menor desigualdade social e maior qualidade de vida
humana e ambiental” - Alves, 20/07/2016.
O
Canadá e a Índia são dois grandes países, com ampla disponibilidade de recursos
naturais, e uma biocapacidade total de aproximadamente 560 milhões de hectares
globais. Porém, o Canadá possui superávit ambiental e a Índia possui déficit
ambiental.
Vamos
recordar os conceitos da Global Footprint Network. A Pegada Ecológica é uma
metodologia de contabilidade ambiental que avalia a pressão do consumo das
populações humanas sobre os recursos naturais. Expressada em hectares globais,
permite comparar diferentes padrões de consumo e verificar se estão dentro da
capacidade ecológica do planeta. A biocapacidade é a área que um país tem para
satisfazer as necessidades de consumo e assimilação dos resíduos dos seus
habitantes, correspondendo à capacidade de geração e regeneração dos serviços
ecossistêmicos.
A
população mundial tinha uma Pegada Ecológica per capita de 2,84 hectares
globais (gha) em 2012. A Pegada do Canadá era de 8,2 gha e a da Índia era de
1,2 gha. Assim, a maior Pegada Ecológica do Canadá reflete o maior padrão de
consumo do país. Os canadenses, em média, consumiam quase 7 vezes mais do que
os indianos, em 2012. Se o padrão de consumo fosse o único problema a situação
ecológica do Canadá seria muito pior do que a da Índia.
Porém,
a Pegada per capita é só parte do problema. Para se calcular a Pegada Ecológica
total é preciso multiplicar a Pegada per capita pela população. Fazendo estas
contas achamos que a Pegada total da população canadense (de 35 milhões de
habitantes) era de 284 milhões de gha. Como a biocapacidade era de 560 milhões
de gha, então o Canadá apresentou superávit ambiental. A biocapacidade era o
dobro da Pegada Ecológica total.
A
Pegada Ecológica total da Índia (população de 1,237 bilhão de habitantes) era
de 1,435 bilhão de gha. Como a biocapacidade era de 560 milhões de gha, então a
Índia apresentou grande déficit ambiental. A Pegada Ecológica total da índia
era mais do dobro da biocapacidade total e o déficit ambiental está crescendo e
tende a aumentar ainda mais com o crescimento demoeconômico do país, que
inclusive vai passar a China como a nação mais populosa do mundo a partir de
2025.
O
que estes números mostram é que o alto padrão de consumo não gera déficit
ambiental se o volume da população é pequeno em relação à biocapacidade. E um
padrão de consumo baixo, como na Índia, pode levar ao déficit ambiental se a
população for muito grande em relação à biocapacidade.
Nos
últimos 45 anos a Pegada Ecológica mundial ultrapassou a biocapacidade do
Planeta. Desde o início dos anos 1970, o déficit ambiental vem subindo
constantemente. Em 2012, o mundo tinha uma população 7,1 bilhões de pessoas,
com uma pegada ecológica per capita de 2,84 hectares globais (gha) e uma
biocapacidade per capita de 1,73 gha, como mostra o gráfico abaixo.
O mundo tinha em 2012 uma biocapacidade total de 12,2 bilhões de hectares globais, mas tinha uma pegada ecológica de 20,1 bilhões de hectares globais. Portanto, a pegada ecológica ultrapassava a biocapacidade em 64%. Ou dito de outra maneira, o mundo estava consumindo o equivalente a 1,64 planetas. Portanto, a população mundial vive no vermelho e provoca um déficit ambiental que cresce a cada ano.
O mundo tinha em 2012 uma biocapacidade total de 12,2 bilhões de hectares globais, mas tinha uma pegada ecológica de 20,1 bilhões de hectares globais. Portanto, a pegada ecológica ultrapassava a biocapacidade em 64%. Ou dito de outra maneira, o mundo estava consumindo o equivalente a 1,64 planetas. Portanto, a população mundial vive no vermelho e provoca um déficit ambiental que cresce a cada ano.
O
planeta Terra é único. Não dá para usar mais de um planeta, no longo prazo, sem
destruir toda a herança acumulada pela natureza durante milhões de anos.
Portanto, é preciso decrescer do uso de 1,64 planetas para 1 planeta. Existem
três alternativas:
1)
diminuir o padrão de consumo dos habitantes do globo (principalmente o consumo
conspícuo e os tipos de consumo mais poluidores e degradadores do meio
ambiente);
2)
diminuir o volume da população mundial;
3)
diminuir o consumo e a população ao mesmo tempo.
Evidentemente
a terceira alternativa é a mais rápida. Acontece que não dá para reduzir o
volume da população mundial no curto prazo, pois a estrutura da pirâmide etária
mundial é ainda jovem. Atualmente, a taxa de fecundidade total (TFT), na média
mundial, está em torno de 2,5 filhos por mulher e na tendência de queda lenta
da TFT a população mundial chegaria a mais de 11 bilhões de habitantes em 2100.
Se a taxa de fecundidade cair em ritmo mais rápido nos próximos anos, para algo
em torno de 1,7 ou 1,8 filhos por mulher, então a população mundial começaria a
diminuir em meados do século XXI e poderia ficar abaixo de 7 bilhões de habitantes
em 2100. Se o mundo atuar agora poderá reduzir o ritmo do crescimento atual e
iniciar um decrescimento na segunda metade do século XXI.
Assim,
a Terra pode ter 4 bilhões de pessoas a menos do que o previsto em 2100. Serão
4 bilhões a menos de pessoas a sofrer as consequências deixadas pelos seus
antepassados na destruição da biocapacidade e no aumento das emissões de gases
de efeito estufa. Como disse Condorcet, em 1794: “não é racional colocar filhos
no mundo para serem infelizes”. Lembrando que a Índia caminha para ser a nação
mais populosa do mundo e já ocupa o terceiro lugar entre os país mais
poluidores do Planeta.
Desta
forma, de imediato o que se pode fazer é garantir os direitos sexuais e
reprodutivos, possibilitando a redução do número médio de filhos dos casais e
das pessoas solteiras. Ao invés de nascer 140 milhões de bebês por ano, o mundo
pode reduzir este número para, por exemplo, 100 milhões. Seria, de imediato,
uma redução de 40 milhões de pessoas por ano e 400 milhões de pessoas em uma
década. Porém, mesmo que esta diminuição imediata, a redução da população total
(redução do volume do número de habitantes) só aconteceria na segunda metade do
século XXI.
Assim,
paralelamente ao avanço da transição demográfica, a redução do consumo necessita
ser imediata. Segue abaixo uma série de medidas que poderiam ser colocadas em
prática instantaneamente para reduzir a Pegada Ecológica.
A
alternativa mais impactante e inadiável para mudar o padrão de produção e
consumo é a transformação da matriz energética, saindo dos combustíveis fósseis
para as energias alternativas, o que reduziria muito as emissões de carbono.
Outra tarefa urgente é reduzir o tamanho dos rebanhos bovino e de outros
animais (escravizados pela humanidade) que são grandes emissores de metano que
acirra o efeito estufa e o aquecimento global. Para tanto é urgente mudar a
dieta alimentar, abandonando o consumo de carnes e produtos animais para uma
dieta vegetariana e/ou vegana. A alternativa é mudar a forma “petroficada” de
produção agrícola, reduzindo significativamente o uso dos fertilizantes
químicos, dos defensivos e dos agrotóxicos, avançando com a agricultura
orgânica e a permacultura. Reduzir os desperdícios de comida, energia e mudar a
cultura da “obsolescência programada”.
Não menos importante é reconfigurar a organização das cidades incentivando o transporte coletivo, a eficiência energética e a reciclagem de materiais, lixo e resíduos sólidos. A alternativa são os enterros e cemitérios sustentáveis com a substituição dos túmulos por capsulas biodegradáveis que gerem árvores e florestas (cada morto uma árvore e cada cemitério uma floresta). Por fim, e não menos importante, reduzir o máximo possível os gastos militares e as despesas de guerra e violência, etc.
Não menos importante é reconfigurar a organização das cidades incentivando o transporte coletivo, a eficiência energética e a reciclagem de materiais, lixo e resíduos sólidos. A alternativa são os enterros e cemitérios sustentáveis com a substituição dos túmulos por capsulas biodegradáveis que gerem árvores e florestas (cada morto uma árvore e cada cemitério uma floresta). Por fim, e não menos importante, reduzir o máximo possível os gastos militares e as despesas de guerra e violência, etc.
Portanto,
existem muitas alternativas para reduzir a Pegada Ecológica e para eliminar o
déficit ambiental mundial. Falta se chegar a um consenso ideacional e político.
O fato é que o mundo precisa alcançar uma sustentabilidade econômica, entendida
como a capacidade de suportar um determinado nível de produção econômica
indefinidamente em equilíbrio com a natureza; e uma sustentabilidade social,
entendida como a capacidade de um sistema social funcionar plenamente e
indefinidamente em um determinado nível de bem-estar social. Tudo isto com
respeito às demais espécies vivas da Terra e sem mudar a química da atmosfera e
degradar os ecossistemas. (ecodebate)
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