O conflito intergeracional, as mudanças climáticas e
a Terra inabitável.
“Não peçam aos seus filhos respostas para a
bagunça que vocês fizeram” - Greta Thunberg.
A
população humana vem crescendo de geração em geração. Calcula-se que no início
do Holoceno (há cerca de 12 mil anos) o número de pessoas no mundo não
ultrapassava 5 milhões de habitantes, mas cresceu e chegou em torno de 250
milhões no ano 1 da Era Cristã, saltou para 1 bilhão de pessoas em 1800 e deve
atingir 8 bilhões de habitantes em 2023. Segundo estimativas do Population
Reference Bureau (PRB), já nasceram no Planeta, desde o surgimento do Homo
sapiens, algo em torno de 108 bilhões de pessoas.
Em
geral, as gerações mais velhas deixaram uma herança positiva para as gerações
mais novas, tanto em termos materiais, quanto em termos espirituais. Nos
últimos 200 anos, houve uma expressiva redução da mortalidade infantil, um
aumento significativo da esperança de vida ao nascer e uma melhoria das
condições de vida da população mundial, com avanços na educação, saúde,
moradia, etc. Isto é o que se chama de mobilidade social ascendente ou ciclo
intergeracional ascendente, já que, na média, a vida dos filhos melhora em
relação à vida dos pais.
Contudo,
a ascensão das gerações humanas ocorreu às custas da involução da biodiversidade,
da diminuição da riqueza natural e da degradação dos ecossistemas. Enquanto a
humanidade enriquecia o meio ambiente empobrecia. A ECOnomia avançou degradando
a ECOlogia, mas é a primeira que depende da segunda e não o contrário. Ou seja,
o ser humano depende da natureza e a natureza floresce melhor com mais abelhas
e insetos e com menos seres humanos.
O
fato é que o Planeta caminha para um colapso ambiental que pode se transformar
em um colapso civilizacional. Como diz o jornalista David Wallace-Wells,
caminhamos para uma “Terra inabitável”, pois além dos diversos elementos de
degradação (como a acidificação dos solos, águas e oceanos, a precarização dos
ecossistemas e os desastres climáticos extremos: secas, chuvas, furacões e
inundações de grandes proporções), o aquecimento global vai ser abrangente,
terá um impacto muito rápido e vai durar muito tempo. Isto quer dizer que os
efeitos danosos das mudanças climáticas vão se agravar no futuro e, embora
todas as gerações já estejam sendo atingidas, são as crianças e jovens que
nasceram no século XXI que vão sentir as maiores consequências do colapso
ambiental.
O
padrão de vida adotado nos últimos 200 anos (desde o início do uso generalizado
dos combustíveis fósseis e do consumismo extremo) está provocando a 6ª extinção
em massa das espécies, reduzindo a biocapacidade da Terra, aquecendo o Planeta
e levando a humanidade para o rumo do abismo. Evidentemente, são as novas e a
futuras gerações que irão pagar o maior preço pelo irresponsável estilo de vida
das antigas e atuais gerações de humanos.
Desta
forma, torna-se impactante quando uma estudante sueca de 16 anos, Greta
Thunberg, lidera um movimento global contra as mudanças climáticas e chama a
atenção dos adultos para o caos climático que já provoca tantas destruições e
que deve se agravar nos tempos vindouros. O evento de caráter revolucionário
ficou conhecido como: “Greve Global pelo Futuro: um movimento de estudantes
contra a inércia dos adultos”
As
manifestações em 15 de março de 2019, foram as maiores
mobilizações globais contra as mudanças climáticas antropogênicas de todos os
tempos. Ao todo, aconteceram pelo menos 2 mil eventos, em mais de 1.300
cidades, ocorridos em 123 países, envolvendo milhões de estudantes.
Greta
Thunberg (que foi indicada para o Prêmio Nobel da Paz) disse: “Precisamos
urgentemente de uma visão holística para lidar com a crise de sustentabilidade
total e o desastre ecológico em curso. E é por isso que eu sempre digo que
precisamos começar a tratar a crise pelo que ela é. Porque só assim – e só
guiados pela melhor ciência disponível (como está claramente afirmado em todo o
Acordo de Paris) – é que podemos começar a criar juntos uma saída global”. Mas
ela reclama dos críticos que dizem que os jovens não oferecem soluções para a
crise ecológica: “Como vocês podem jogar esse fardo sobre nós?”.
Mas
o que ecoa mais forte por parte de todo este movimento da juventude mundial
contra o desastre ecológico é a frase de Greta direcionada às gerações ascendentes: “Não peçam aos seus filhos respostas
para a bagunça que vocês fizeram”.
Este
alerta vem modificar a relação existente entre as gerações, base de um
relacionamento que prevaleceu nos últimos 12 mil anos (quando havia
estabilidade homeostática do clima durante o Holoceno). No passado, os filhos
agradeciam aos pais por terem nascidos e davam crédito e reconhecimento por
receberem um herança positiva.
Mas
atualmente, os filhos questionam os pais pela bagunça onde eles nasceram. As
crianças e adolescentes estão começando a perceber que estão recebendo uma
“herança maldita” e que vão ter que pagar pelo passivo ambiental deixado pelas
gerações mais velhas. A crise ecológica e climática está acirrando o conflito
intergeracional e agravando o mal-estar civilizacional.
Os
108 bilhões de humanos que já passaram pela Terra – onde quer que estejam – vão
ter que pedir desculpas para as futuras gerações. E algumas pessoas já estão
fazendo cobranças. O indiano Raphael Samiel, de 27 anos, decidiu entrar na
justiça contra os próprios pais, que o conceberam sem o seu consentimento. Ele
disse: “É errado trazer crianças ao mundo porque elas têm que tolerar o
sofrimento ao longo da vida”. Os movimentos GINK (Green Inclination, No Kids) e
“BirthStrike” (greve de nascimento por causa do aquecimento global) já
compreenderam que o ambiente não é favorável às gerações descendentes.
Catástrofe
climática: a Terra inóspita e inabitável.
É
complicado e embaraçoso os país sentirem culpa pela geração de filhos. Mas esta
é a tristonha realidade global. Por isto, a esperança contra o apocalipse
climático está depositada nas “Sextas-feiras pelo futuro”. (ecodebate)
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