Análise da evolução dos
modelos de gestão de recursos hídricos no Brasil.
Resumo: A
água é um recurso essencial para a vida, mas é finita, e em várias regiões do
mundo já são observados conflitos devido a sua escassez. A preservação desse
recurso e a garantia de seu acesso à todos é uma das metas atuais da
humanidade. Esse artigo tem como objetivo analisar a evolução das legislações
sobre a gestão de recursos hídricos no Brasil e refletir como o estudo do uso das águas no passado possibilita um
planejamento melhor do futuro e o seu uso de forma mais sustentável. Foram
realizadas pesquisas bibliográficas e documentais, de natureza qualitativa. O
gerenciamento das águas no Brasil não é um fenômeno recente, e já pode ser
observado desde o período colonial. A população de baixa renda sempre foi a
mais desfavorecida com o abastecimento. Á água foi constantemente explorada
como um recurso econômico, sem preocupação com a sua preservação. Atualmente, o
modelo de gestão integrada de recursos hídricos, introduzido pela Lei
9.433/1997, estabelece a importância de compatibilizar a demanda com a oferta
de água, garantindo o uso sustentável e a distribuição para toda a população.
As legislações brasileiras são consideradas como as mais avançadas do mundo
para a gestão de recursos hídricos, mas é necessário garantir a efetividade
delas na prática. Para atingir esse objetivo, é preciso levar em conta que não
só a escassez física, como também, desigualdades políticas e socioeconômicas,
influenciam no acesso à água. Conclui-se
que, além da limitação física e climática, o acesso a água está relacionado a
desigualdades estabelecidas historicamente entre grupos sociais e a um processo
de apropriação de recursos comuns, a serviço de um desenvolvimento desigual e
excludente.
Introdução
A água é recurso finito e se auto
depura, mas dependendo do grau de contaminação, o seu ciclo hidrológico nem
sempre é suficiente para purificá-la. Além disso, sua distribuição depende de
condições climáticas e topográficas, o que faz a quantidade do recurso ser
diferente entre os territórios. Nas últimas décadas observa-se uma crescente
preocupação da sociedade com a sua conservação: uma maior conscientização da
necessidade de uma nova cultura em relação ao uso dos recursos hídricos,
repensando valores, comportamentos, hábitos e atitudes.
A importância da água foi
reconhecida pelas legislações ao longo da história. Atualmente, o acesso à água
é considerado um direito humano fundamental e indispensável à vida com
dignidade. Esse direito foi conquistado aos poucos e precisa ser concretizado
no cotidiano, garantindo o acesso à água potável para todos.
Em 1997 foi proposto um novo
modelo de gestão de recursos hídricos, introduzido pela Lei 9.433/1997, a
Política Nacional de Recursos Hídricos (PNRH). A norma é considerada como a
balizadora da gestão dos recursos hídricos e prevê que a gestão da água deve se
preocupar com a qualidade e a quantidade do recurso, levando em conta as
diversidades geográficas e socioeconômicas de cada região do país. No entanto,
a gestão de recursos hídricos não deve ser considerada um fenômeno recente no
Brasil, mas um processo inerente a colonização portuguesa, (FONSECA & PRADO
FILHO, 2016).O gerenciamento de recursos hídricos se refere a utilização de
medidas estruturais (construções de barragens, adutorase de estações de
tratamento de água) e não estruturais (zoneamento de ocupação de solos,
regulamentos contra desperdício de água) para que os sistemas hídricos,
artificiais ou naturais, possam ser utilizados nas atividades humanas de forma
sustentável, como descreveu Grigg em 1996. Em 2009, Ioris afirmou que a gestão
de recursos hídricos engloba tanto práticas e tecnologias que visam à
distribuição, uso e conservação da água, como às questões políticas e de
desenvolvimento nacional, complementando assim, o conceito de Grigg. O que é
validado por Fracalanza e Campos (2010) quando afirmam que a gestão das águas
inclui: a política de águas; o plano de uso, controle e proteção das águas; o
gerenciamento e o monitoramento dos usos da água.
Esse artigo tem como objetivo
apresentar a evolução da legislação sobre a gestão das águas no Brasil, levando
em conta a evolução do controle sobre o uso da água desde o período
pré-colonial, e demostrando que o gerenciamento das águas no país não é um fenômeno
recente. Entender o uso das águas no passado é uma forma de aprendizado que
possibilita um planejamento melhor do futuro e o uso mais sustentável da água.
Evolução da Gestão de Recursos
Hídricos no Brasil
Para Benjamim (1999) a história
da legislação sobre a água no Brasil pode ser dividida em três fases: a fase de
exploração desregrada, a fase fragmentária e a fase holística. Essas fases,
também, podem ser utilizadas para entender a evolução regulatória da gestão dos
recursos hídricos.
Primeira Fase: Fragmentária
Na primeira fase, que engloba o
período a partir do descobrimento do Brasil até o ano de 1930, não observa-se
uma preocupação com o meio ambiente. As normas jurídicas da época tinham o
intuito de assegurar a preservação de recursos que tinham valor econômico, como
o pau-brasil. A proteção à água não estava inclusa.
As Ordenações Filipinas foram
as primeiras a trazer um dispositivo relacionado com a proteção das águas. No
conceito de poluição, a lei proibiu a população de jogar em rios ou lagos
materiais que pudesse levar a morte de peixes ou poluir as águas (ALMEIDA,
2002).
Até a independência, a
preocupação era utilizar os recursos naturais existentes na colônia, com o
intuito de fortalecer a economia da metrópole (FARIAS, 2009). Os portugueses
e outros imigrantes utilizavam à água conforme sua disponibilidade, “quanto
maior a disponibilidade de água, maior o desperdício, seja em quantidade, seja
em qualidade”(ANA,
2007, p. 42).
Com a independência do Brasil
foi promulgada a Constituição Imperial, em 1824, que não trouxe dispositivo
sobre a proteção das águas. O artigo 162 do Código Penal de 1890, relacionou a
proteção as águas com o direito à saúde. Dispôs que era crime corromper a água
potável, tornando a nociva à saúde (ALMEIDA, 2002).
O Código Civil de 1916 fez
menção à água, apenas regulando o direito de uso em relação ao direito de
vizinhança. Considerou a água como um bem de valor econômico limitado e de
domínio privado.
Nesse período não houve uma
preocupação com a proteção da água, procurava-se proteger alguns recursos
naturais de interesse econômico. Poucas leis abordavam o uso dos recursos
hídricos.
Segunda Fase: Setorial
O início da gestão dos recurso
hídricos no Brasil teve como marco instrumentos burocráticos, sendo as
características principais desse modelo a centralização e a tendência
legalista. Na fase setorial, foram criadas as primeiras legislações que visavam
o controle das atividades exploratórias. Diante dos conflitos pelo uso das
águas foi gerada uma grande quantidade de leis e regulamentos, alguns dos quais
posteriormente se tornaram princípios constitucionais. Em consequência disso, a
gestão da água era centralizada, já que a autoridade e o poder foram se
concentrando em entidades públicas, que através de instrumentos burocráticos
deviam aprovar concessões, autorizar o uso, licenciamento de obras, realizar
fiscalização, etc. (LANNA, 1997).
O interesse pela elaboração de
leis para regular o uso da água estava relacionada a crescente demanda por
energia elétrica. A primeira legislação brasileira que se referiu a água como
objeto específico de lei foi o decreto 26.643 de 1934, denominado “O Código das
águas”. Nesse código foi classificado tipos de água, formas de aproveitamento,
medidas em caso de contaminação dos corpos hídricos, critérios para utilização
das águas pelas indústrias, (MILARÉ, 2007;CARVALHO, 2015).
A literatura mostra uma
divergência da razão da existência do código das águas. De acordo com Milaré
(2007), o Código de Águas possibilitou o aproveitamento industrial dos recursos
hídricos, principalmente, no ramo da energia hidráulica. Em 2015, Carvalho
confirma que esse decreto foi criado devida a necessidade de uma maior
utilização dos recursos naturais para a geração de energia elétrica. No
entanto, Costa e Silva et al (2016) consideram que devido ao Código
de Águas atribuir competência ao Ministério da Agricultura para proteção dos
recursos hídricos, fica claro uma preocupação agrícola.
A Constituição Federal de 1934
dispõe em seu art. 5º, inciso XIX, alínea “j” que compete privativamente à
União legislar sobre as águas (BRASIL, 1934). A Constituição de 1946
definiu as águas como bem de domínio dos estados e da União. Os lagos e
correntes em terrenos da União, que banhem mais de um Estado, que sirvam de
limite com outros países ou se estendiam a território estrangeiro eram
considerados bens da União. Os estados tinham em seu domínio lagos e rios em
terrenos do estado e os com nascente e foz no território estadual. Analisa-se
nesse caso certa evolução, passando os estados a ter domínio sobre os recursos
hídricos em seus territórios.
É possível notar que nessa fase
permaneceu a preocupação com a exploração econômica dos recursos naturais.
Juridicamente, foram criadas legislações que buscavam a regulamentação de
atividades exploratórias e tipificavam condutas que causavam danos ao meio
ambiente. A gestão das águas limitava-se a proteção da sua quantidade, sem
preocupação com a sua qualidade e refletia mais cautelas econômicas do que
ecológicas.
Terceira Fase: Holística
A fase holística é
caracterizada pela preocupação com o uso sustentável da água. O conceito
de desenvolvimento sustentável foi difundido após a publicação do Relatório
Brundtland. A necessidade de um modelo de desenvolvimento econômico que procure
atender às necessidades das gerações atuais sem comprometer a capacidade das
gerações futuras de terem suas necessidades atendidas ganhou enfoque (BARBOSA,
2007).
A preocupação com a proteção
ambiental e a necessidade da gestão das águas de forma sustentável, também,
ganhou uma dimensão internacional com as discussões do Clube de Roma, em 1968,
que enfatizou a importância do estabelecimento de formas sustentáveis de
utilização dos recursos hídricos. A Conferência de Estocolmo que ocorreu em
1972, registrou o começo de preocupações políticas com questões ecológicas.
A Conferência das Nações Unidas
sobre Água, 1977, em Mar del Plata foi a primeira conferência internacional
criada, especificamente, para resolver problemas relacionados aos recursos
hídricos. Mais tarde, vários outros encontros internacionais foram mostrando a
importância da gestão das águas, como é possível visualizar nos quadros 1 e 2 .
Quadro 1: Encontros
Internacionais sobre a Água
Encontro/Documento
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Ano
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Importância
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Declaração Universal dos
Direitos Humanos
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1949
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Foi um marco para a criação
de um sistema de proteção internacional aos direitos humanos, e o passo
inicial para se falar no direito humano à água. Embora não haja menção
específica à água nessa declaração ou nos Pactos de Direitos Humanos, alguns
autores afirmam que esse direito estaria implícito, já que, sem água, muitos
dos direitos reconhecidos nesses instrumentos não teriam efeito.
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Conferência de Estocolmo/
Declaração de Estocolmo
|
1972
|
Entre outros assuntos,
abordou a necessidade de combater a poluição, reduzir o volume de lixo e
proteger os mares e a vida marinha.
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Conferência de Mar del Plata/
Plano de Ação Mar del Plata
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1977
|
O primeiro encontro que
tratou exclusivamente de problemas relacionados aos recursos hídricos. A
partir dele que se estabeleceram as resoluções sobre a acessibilidade aos
recursos hídricos, abastecimento, uso da água na agricultura, pesquisa e
desenvolvimento. E, também foi estabelecida a Década Internacional do
Fornecimento de Água Potável e Saneamento (1981-1990), onde os países
participantes assumiram o compromisso de realizar melhorias no suprimento de
água potável e nos setores sanitários.
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Comissão Mundial sobre Meio
Ambiente e Desenvolvimento/ Relatório Brundtland.
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1985
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Foi a comissão que criou
o Relatório Nosso Futuro Comum,
publicado em 1987, que difundiu a ideia do desenvolvimento sustentável.
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Quatro Convenções de Genebra/
Protocolo, e Protocolos Adicionais I e II
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1949 e 1977
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Houve a criação de três
protocolos, onde foi reconhecido o direito à água tratada, devido à
preocupação com a falta de água potável em quantidade e qualidade nos
conflitos armados.
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Convenção sobre os Direitos
da Criança/ Decreto nº 99.710/1990
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1990
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Foi indicado que o Estado
deve garantir o acesso à água e ao saneamento básico a todas as crianças, com
o objetivo de combater doenças, desnutrição e mortalidade infantil.
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Convenção sobre a Utilização
dos Cursos de Águas Internacionais para fins diferentes dos da navegação
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1997
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Foi demonstrado a importância
da minimização dos conflitos entre usos hídricos para a satisfação das
necessidades humanas vitais.
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Conferência do Rio – ECO 92 e
a Agenda 21
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1992
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Resultaram dois importantes
documentos: a Carta da Terra, que contêm princípios que visam à proteção do
meio ambiente; e a Agenda 21, que enumera metas e objetivos para o
desenvolvimento sustentável. Aborda o manejo integrado dos recursos hídricos
com o objetivo de protegê-los.
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Declaração do Milênio e
Declaração Política de Johanesburgo
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2002
|
Propôs medidas para ampliar o
acesso às necessidades básicas como “a água potável, o saneamento, habitação,
energia, assistência médica, segurança alimentar e a proteção da
biodiversidade”. […] (ORGANIZAÇÃO DAS NAÇÕES UNIDAS, 2002, Artigo 18).
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Assembleias gerais das Nações
Unidas
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1999 a 2010
|
– Em1999, indicou que a
garantia à água limpa é necessária para concretizar o direito ao
desenvolvimento e é um dever moral para os países e para a comunidade
internacional.
– Em 2000, o Comitê de
Direitos Econômicos, Sociais e Culturais do Conselho Econômico e Social da
ONU, passou a estudar o tema do “direito humano à água”. Segundo o Comitê, a
água não deve ser tratada apenas com um bem econômico, mas também social e
cultural. A água deve ser usada de forma sustentável, para que possa ser
desfrutada pelas gerações presentes e futuras (CORTE, 2015).
– Em 2003, a Assembleia Geral
das Nações Unidas (por meio de resolução 58/217) pediu uma maior atenção para
a execução de programas e projetos relacionados com a água “e, ao mesmo
tempo, assegurar participação e intervenção de mulheres em medidas de
desenvolvimento relacionadas à água (pag. 01)”.
– Em resoluções de 2008 e
2009, o Conselho Econômico e Social da ONU reconheceu que é dever dos Estados
assegurar e eliminar as desigualdades no acesso à água doce potável e ao
saneamento, e que os planos de ação adotados pelos Estados devem incentivar a
participação das comunidades, levando em consideração o gênero feminino
(BRZEZINSKI, 2012).
– Em 2010, a
Resolução 64/292 da Assembleia Geral da ONU, reconheceu o direito à
água e ao saneamento como direitos humanos. E em 2014, a Resolução 27/7
do Conselho dos Direitos Humanos, destacou a importância da cooperação
internacional para garantia dos direitos à água e ao saneamento.
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Convenção sobre os Direitos
das Pessoas com Deficiência/ Decreto nº 6.949/ 2009
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2009
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Levou a elaboração do Decreto
nº 6.949/2009 que garantiu o direito das pessoas com deficiência ao acesso à
água limpa.
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Quadro 2: Fóruns mundiais da
água
Ano
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Local
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Resultados
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1977
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Marrakesh-Marrocos
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Declaração de Marrakesh
– Reconhecimento da água
limpa e potável como necessidade humana básica.
– Recomendações e ações para que os líderes mundiais garantam as
necessidades das gerações futuras.
– Discussão
sobre questões relativas à equidade de gênero.
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2000
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Haia-Holanda
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Tema: acesso à água, a
participação das mulheres, os jovens e as crianças e as Organizações Não
Governamentais (ONGs).
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2003
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Kyoto-Japão
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Ações planejadas para o
desenvolvimento de políticas, o gerenciamento de recursos hídricos, a mitigação
de desastres naturais e a prevenção da poluição.
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2006
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Cidade do México-México
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Temáticas: o gerenciamento de
riscos, água e saneamento, implementação de gestão integrada de recursos
hídricos, água para fins de desenvolvimento. Ficou estabelecido que os
Estados, com a participação da comunidade garantiriam o acesso à água como
direito humano fundamental.
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2009
|
Istambul-Turquia
|
Os países participantes se
comprometeram em realizar melhorias nos planos de serviço de água locais
|
2012
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Marseille-França
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Centrou-se em quatro ações
prioritárias relacionadas ao desenvolvimento econômico, bem-estar, condições
para o sucesso e manutenção da água no planeta. Através da Agencia
Nacional da Água (ANA), o Brasil foi um dos responsáveis por incentivar o
debate sobre a governança global da água.
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2015
|
Deagu-Coreia do Sul
|
Tema água para o futuro.
Houve um amplo debate sobre a questão dos recursos hídricos e ações para
preservação da água.
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2018
|
Brasília -Brasil
|
Tema: segurança hídrica. O
debate de gênero teve lugar de destaque nas programações do evento
|
Na fase holística foi aprovada
a Lei nº 6.938/81, que deu origem a Política Nacional do Meio Ambiente buscando
uma gestão que visa a preservação de todos os recursos naturais de forma única
e completa e iniciando um novo sistema integrado de proteção ao meio
ambiente. Após, a Lei 6.938, instituiu-se o Sistema Nacional de Meio
Ambiente – SISNAMA, que seria gerido por órgãos municipais, estaduais e
federais. O órgão superior do SISNAMA é o Conselho Nacional do Meio Ambiente –
CONAMA, que foi o responsável por editar a Resolução 020, de 18.06.1986, que
inaugurou, no Brasil, a gestão da qualidade das águas.
A Constituição Federal de 1988
modificou o Código de Águas de 1934, extinguindo as águas particulares. Todas
as águas foram consideradas bens de uso comum do povo, cabendo a União legislar
sobre as águas. Assim, a competência para legislar continuou centralizada, mas
a gestão foi compartilhada (BRASIL, 1988).
O domínio das águas foi
dividido entre a União e os Estados, ainda na Constituição de 1946. Em 1988
assim se manteve e acrescentou para os Estados, o domínio das águas
subterrâneas. E para a União, ajuntou-se o mar territorial, os potenciais de
energia hidráulica e os depósitos de água decorrentes de obra da mesma.
A Constituição de 1988 também
previu a criação do Sistema Nacional de Gerenciamento dos Recursos Hídricos –
SINGREH. Posteriormente, foi promulgada a Lei 9.984, de 17.07.2000, que
criou a Agência Nacional de Águas – ANA.
O primeiro estado a criar sua
Política Estadual de Recursos Hídricos e o Sistema Integrado de Gerenciamento
de Recursos Hídricos foi São Paulo. Mais tarde, os estados do Ceará (1992),
Santa Catarina (1994), Rio Grande do Sul (1994), Bahia (1995), Rio Grande do
Norte (1996) e Paraíba (1996) editaram suas leis estaduais de recursos hídricos
(SILVA, 1998).
Em 1989 foi fundado o primeiro
Consórcio Intermunicipal do país, localizado no Estado de São Paulo (Bacias dos
rios Piracicaba e Capivari). A partir de então, vários consórcios de bacia
foram surgindo, com o objetivo de promover a descentralização das ações, e
ampliar o campo da gestão participativa (SILVA, 1998). São Paulo, também, foi
um dos primeiros estados a realizar o Plano Estadual de Recursos Hídricos.
A lei federal nº. 9.433 de
1997, instituiu a Política Nacional de Recursos Hídricos (PNRH). Essa lei
estabeleceu princípios para a proteção e controle das águas, estabelecendo a
gestão integrada dos recursos hídricos. Propôs instrumentos, como: oSistema Nacional de Informações sobre
Recursos Hídricos (SNIRH); o monitoramento da qualidade da água, a outorga e a
cobrança pelo uso de recursos hídricos; sistemas de fiscalização e
enquadramento etc. Reconheceu a bacia hidrográfica
como unidade territorial e a descentralização das decisões como uma das formas
de gestão (BRASIL, 1997).
A adoção da bacia hidrográfica,
no caso do Brasil, visa contribuir para uma integração entre o sistema de
gestão ambiental e o sistema de gestão dos recursos hídricos. A população, os
usuários e os responsáveis pela administração pública podem expor seus
interesses e se mobilizarem em defesa das águas Juntos conseguem analisar as
potencialidades e fragilidades da bacia, permitindo uma boa gestão da água.
O Sistema Nacional de
Gerenciamento dos Recursos Hídricos (SINGREH) é o órgão responsável por
implementar a PNRH. O órgão de mais alta hierarquia na gestão da água é o
Conselho Nacional de Recursos Hídricos (CNRH), que possui 10 câmaras técnicas
que cuida de assuntos específicos; conselhos e comitês de bacias, responsáveis
por aspectos participativos de formulação e deliberação; secretarias de Estado
e Ministério do Meio Ambiente – MMA, responsáveis pelas políticas
governamentais a nível estatual e federal, respectivamente; Agência Nacional de
Águas, órgãos gestores estaduais de água, que são responsáveis pela
implementação e regulação (BRASIL, 1997).
Para Ioris (2009) houve avanços
nos procedimentos regulatórios brasileiros, mas ainda existem injustiças
ambientais e hierarquização de oportunidades. Observa-se um distanciamento
entre o discurso e a prática; a manutenção de assimetrias e poderes,
principalmente quanto aos processos decisórios. Ele afirma que a forma de lidar
com os problemas ambientais ainda está centrado nos sintomas. Os avanços nas
legislações surgiram apenas
como respostas às contradições causadas pela atividade econômica. E apesar das mudanças positivas nas legislações, os comitês de
bacias vem apresentando difuculdades operacionais e no exercício da governança
participativa. Uma dessas dificuldades é ilustrada por Valencio e Martins (2004)
quando destacam que o processo de implantação dos comitês e instrumentos de
gestão necessitam de apoio financeiro
e aprovação politíca por parte da ANA, o que leva na prática a criação de
mecanismos hierarquizados e rígidos e que são úteis apenas aos grupos com maior
força politica.
A água sempre fez parte do
processo produtivo brasileiro, e mesmo com as novas legislações que visam
proteger o o recurso, muitas vezes, na prática, prevalece a permissão para seu
uso insustentável em determinadas atividades econômicas. Observa-se restrições
em determinada área
geográfica, e estimulo das mesmas atividades em regiões que apresenta
resistência política menor.
Apesar dessas críticas,
atualmente, as legislações brasileiras sobre a gestão dos recursos hídricos,
são consideradas como as mais avançadas do mundo. O sistema jurídico possui
normas de gestão e conservação que considera a água como um bem ambiental
limitado e dotado de valor econômico. É preciso garantir a efetividade dessas
legislações para possibilitar uma boa gestão dos recursos hídricos.
Considerações Finais
As primeiras civilizações do
planeta se instalavam em locais que apresentavam solo produtivo e abundancia de
água, o que tornava mais cômodo o atendimento de suas necessidades básicas. Com
o aumento populacional passou a ser necessário usar a água de forma mais
racional, tendo em vista o surgimento de conflitos e a possibilidade de sua
escassez. A história da evolução do uso da água no Brasil está relacionada ao
seu desenvolvimento econômico e ao processo de urbanização.
Antes da colonização, a
exploração de recursos naturais pelos indígenas era baixa. Eles utilizavam uma
técnica rudimentar na obtenção dos meios de subsistência, caracterizada pela
caça, pesca e coleta, atividades que não causavam degradação ambiental
significativa.
A evolução legal da gestão dos
recursos hídricos no Brasil foi dividida em três momentos. Esses momentos
abordam desde a chegada dos portugueses em 1500 até a fase atual.
A primeira fase que vai do
descobrimento até 1930, nas regulamentações ambientais não é observada
preocupação com o meio ambiente, exceto pela proteção de recursos naturais que
tinham valor econômico para a metrópole, não se incluia a água. Nesse período,
a grande quantidade de água existente influenciou a colonização do território,
a cultura e a relação da sociedade com a natureza. Nessa época, parte da
população sofria com a falta de abastecimento, principalmente aquela com menos
recursos financeiros.
Na fase setorial foram criadas
as primeiras legislações que visavam o controle das atividades exploratórias.
Elas não tinham um intuito preservacionista, apenas estabeleciam critérios
para utilização dos recursos hídricos.
Na fase holística,
iniciou-se a preocupação com o uso sustentável da água. A Lei da Política Nacional de Recursos
Hídricosganha destaque, pois estabelece a metodologia de gestão integrada das
águas. A gestão integrada de
recursos hídricos é um modelo de gestão que tem como objetivo diminuir os
conflitos de uso e garantir a qualidade e quantidade da água para suprir as
demandas atuais e futuras da sociedade, utilizando um conhecimento integrado
dos problemas existentes nas bacias. É preciso buscar a efetividade desse
modelo na prática, para uma gestão sustentável das águas.
O uso dos recursos hídricos
esteve ligado a um processo de acumulação econômica, que exclui os grupos com
menor recurso financeiro e que prioriza o lucro à proteção do recurso.
Inicialmente, não havia uma preocupação com a preservação da água. Em regiões
de escassez, posições de poder e questões econômicas, também influenciaram no
acesso ao recurso. Para alcançar o objetivo do uso sustentável dos recursos
hídricos questões políticas e econômicas devem ser consideradas. (ecodebate)
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