Consórcios de recursos hídricos, rumo a governança
na gestão, parte ½.
MATOS (2013) fornece uma visão
geral sobre Consórcios Intermunicipais que, atuam de forma integrada aos
Comitês de Bacias Hidrográficas, promovendo a gestão descentralizada e
participativa dos recursos hídricos.
Analisando informações
coletadas em instrumento próprio, começa explicitando o que são consórcios
intermunicipais, segundo o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística
(IBGE). Os consórcios são acordos firmados entre municípios para a realização
de objetivos de interesse comum.
Um dos principais motivos para
se criar um consórcio é a carência dos gestores locais, tanto de capacidade
instalada, quanto de recursos financeiros e humanos, frente ao desafio da
descentralização.
Outros motivos incluem a
possibilidade de implementação de ações conjuntas, a possibilidade de
articulação de pressão conjunta junto aos órgãos de governo e a capacidade de
visão holística dos ecossistemas, em termos de planejamento e intervenção.
Através deste tipo de
estratégia de articulação entre os municípios, também chamada de cooperação
horizontal, conforme mencionado por DINIZ (2009), existem vastas possibilidades
de atuação por meio dos consórcios intermunicipais.
Na questão do gerenciamento dos
recursos hídricos, o desenvolvimento do novo modelo de gestão de políticas
públicas, com a formulação conjunta de políticas e programas ambientais, tem
possibilitado a ampliação da oferta de serviços por parte dos municípios, a
flexibilização de contratação de pessoal e a realização conjunta de obras e
prestação de serviços e atividades (CARVALHO, 2007).
Busca-se através da pesquisa
identificar o grau de participação do municípios nos consórcios, a presença de
fatores dificultantes e facilitadores para a consolidação de consórcios, bem
como fatores de fomento à cooperação intermunicipal.
Segundo LACZYNSKI e TEIXEIRA
(2012), citando ABRUCIO, SANO e SYDOW (2010), os consórcios intermunicipais são
estruturas de cooperação horizontal e configuram iniciativas dos próprios
municípios, a partir “da identificação de um problema comum e da construção de
um sistema de governança entre eles que permita uma relação simétrica entre os
atores envolvidos”.
Os consórcios públicos com os
estados, estruturas de cooperação vertical município-estado, geralmente são
induzidos pelos governos estaduais para “maximizar ações em políticas públicas”
em saúde, desenvolvimento e infraestrutura.
Os consórcios com a União,
estruturas de cooperação vertical, são “estimulados pelo governo federal e,
quase sempre, está articulado com as três esferas de governo”. Geralmente, este
tipo de consórcio resulta de condicionalidades externas aos municípios que são
colocadas como indispensáveis para o recebimento de recursos federais para
políticas públicas locais.
Os consórcios interestaduais,
estrutura de cooperação horizontal, “são mais raros e geralmente se
caracterizam por ações de governos estaduais voltadas à implementação de
políticas públicas em regiões fronteiriças sob suas responsabilidades”.
No Brasil, ainda no período da
ditadura militar, segundo BARROS (1995), registra-se a fundação de dois
consórcios intermunicipais em 1969 e 1970, sem nenhuma participação social ou
de órgão descentralizado do poder estadual.
De acordo com SPINK (2012), as
primeiras experiências foram registradas no Estado de São Paulo e das
associações intermunicipais em Santa Catarina. Para LAHÓZ et al. (2007), essas
primeiras experiências concentravam-se em modelos de cooperativas regionais.
Entre 1983 e 1986, registrou-se
o apogeu de criação dos consórcios, sendo também o de maior índice de
mortalidade, “do total de 32, doze não conseguiram sobreviver” (BARROS, 1995,
p. 61).
SPINK (2012) corrobora,
afirmando que a expansão ocorrida na década de 1980 teve continuidade até o ano
de 2005, e ainda que o processo de consolidação dos consórcios aconteceu sem
nenhuma legislação especifica.
De acordo com STRELEC (2011), a
difusão dos consórcios intermunicipais no Brasil ocorreu no contexto de reforma
do Estado e incentivo à descentralização, como uma alternativa para viabilizar
serviços públicos de qualidade ao cidadão-cliente e solucionar problemas que
transcendem os limites territoriais do município.
Para BEST (2011), “não é
possível desassociar o boom de criação de consórcios na década de 1990 dos
processos de redemocratização e descentralização política”. É necessário
considerar nesse contexto que “o consórcio é um mecanismo institucional
relativamente simples, eficaz e democrático de colaboração intergovernamental”
(BEST, 2011:78).
O CEPAM (2001) esclarece que os
consórcios não são entidades supra municipais, ou seja, acima das entidades
municipais que os integram, e também não possuem autonomia política.
São organizações de auxílio e
de cooperação com as unidades que os integram, formulando políticas e
diretrizes intermunicipais, gerenciando planos e programas e realizando obras e
serviços de interesse intermunicipal.
CARNEIRO e DILL (2012)
destacam que independente do formato ou da complexidade da cooperação
municipal, sempre existirão razões de ordem financeira, considerando que muitos
municípios não possuem a autonomia de recursos desejável quando operam de forma
isolada.
Os coletivos intermunicipais,
podem ser mais eficiente, a economia de recursos associada à expansão de oferta
com melhor relação custo-benefício para os cidadãos, que é uma espécie de
sinergia e a cooperação regional que se coloca como meio para se conseguir
ganhos de escala em qualquer política pública.
A legalidade dos consórcios foi
instituída através da Constituição de 1988, como acordos firmados entre
entidades estatais, autárquicas ou paraestatais, sempre da mesma espécie para
realização dos objetivos comuns.
Em 1990, no âmbito da saúde, as
Leis nº 8080/90 e 8142/90, definiram que os consórcios intermunicipais podem
integrar o Sistema Único de Saúde (SUS). Em junho de 1998, a Emenda
Constitucional 19, alterou o artigo 241 que passou a permitir a gestão
associada dos serviços públicos (BRASIL, 1988; DINIZ, 2009).
Os Consórcios Intermunicipais
aflorados sob os respaldos da Constituição, na prática tiveram grandes
dificuldades na sua implantação e desenvolvimento, o que fez com que muitos Consórcios
sucumbissem logo na primeira transição de mandatos de prefeitos.
O fato de não possuírem equipes
técnicas próprias e recursos financeiros garantidos, também foram agravantes
para o andamento do processo.
Ainda, segundo LAHÓZ et al.
(2007), os consórcios, em suas regiões e Estados, passaram a desenvolver
importante contribuição visando a implementação da gestão dos recursos hídricos
e do meio ambiente no país.
Trabalhando na conscientização
de base, envolvendo a sociedade e estabelecendo a interlocução direta com os
organismos governamentais e promovendo debates sobre as legislações pertinentes
ao setor. Em tal panorama, quando ainda não existiam os comitês de bacias, “os
consórcios exerciam a dupla função, de organismo executor e de Parlamento das Águas”.
Mais especificamente na questão
da legislação dos recursos hídricos, segundo a ABERS & JORGE (2005), o
Estado de São Paulo foi o primeiro estado brasileiro a editar uma política de
recursos hídricos, através da Lei 7.663, de 30/12/1991.
Embora o Estado tenha se
baseado nos princípios constitucionais, deixou sem regulamentação aspectos
cruciais, como os mecanismos de cobrança. O Estado do Ceará foi o segundo
estado a editar sua política em 24/07/1992, através da Lei 11.996.
O Estado de Minas Gerais, também
se adiantou à criação da Política Nacional de Recursos Hídricos, e aos
desdobramentos legais que ocorreriam em todo o país posteriormente, instituindo
a Lei federal nº 11.504/94.
Esta Lei dispunha sobre a
Política Estadual de Recursos Hídricos, orientando a elaboração do Plano
Estadual de Recursos Hídricos, a cobrança pelo uso dos Recursos Hídricos e a
composição do Sistema Estadual de Gerenciamento de Recursos Hídricos, dentre
outros (MINAS GERAIS, 1994).
Uma das consequências dessas
discussões foi a criação de uma alternativa mais democrática de gestão dos
recursos hídricos. Em 1997, foi sancionada a Lei nº 9.433/97, que criou a
Política Nacional de Recursos Hídricos (Lei das Águas).
Seu objetivo principal foi
assegurar a disponibilidade de água em padrões de qualidade adequados aos
respectivos usos, buscando a prevenção e o desenvolvimento sustentável pela
utilização racional e integrada dos recursos hídricos.
Alguns dos seus princípios
foram os reconhecimentos da água como bem público finito e vulnerável, dotado
de valor econômico, além da adoção da bacia hidrográfica como unidade de
planejamento (BRASIL, 1997).
No que diz respeito à gestão
ambiental, segundo o IBGE (2008), dos 5.564 municípios brasileiros, 3.332
participam de algum tipo de articulação intermunicipal relacionada ao meio
ambiente, o que corresponde a 60% do total de municípios.
Dos municípios que apresentam
articulação, 1.082 estão associados por meio de consórcios públicos, com o
intuito de enfrentar problemas ambientais comuns, 2.467 participam de comitês
de bacia hidrográfica e 849 municípios participam de outros tipos de associação
ou parcerias (MATOS e DIAS, 2013).
Segundo MATOS (2013), os
comitês de bacia hidrográfica são órgãos normativos e deliberativos, tendo como
função, fundamentar a regulação para o uso da água, desde que não seja fator
impeditivo para manutenção da biodiversidade e para o desenvolvimento
econômico.
Possuem a atribuição legal de
administrar os recursos hídricos na bacia, sendo um canal de discussão, de
busca de convergências e de intervenções para melhorar a qualidade do meio
ambiente na região. E, ainda, garantir a disponibilidade de água em quantidade
e qualidade satisfatórias para todos, nos dias atuais e para as gerações
futuras (MATOS, 2011).
Os Comitês terão para a
execução de suas decisões as Agências de Bacias, entidades jurídicas sem fins
lucrativos, com estrutura administrativa e financeira própria que podem ser
organizadas como fundação de direito privado ou outra personalidade jurídica.
Tendo sua finalidade definida
na legislação de recursos hídricos, destacando-se a de que deverá atuar como
secretaria executiva do respectivo Comitê de Bacias. Esta agência é a entidade
de apoio técnico e de suporte operacional ao respectivo Comitê de Bacia (ANA, 2002).
BROCHI (2007) esclarece que os
consórcios intermunicipais e as associações entre prefeitos, qual podem fazer
parte também empresas públicas e privadas, não figuram, diretamente no Sistema
Nacional de Recursos Hídricos, mas são considerados pela Política Nacional de
Recursos Hídricos como organizações civis de recursos hídricos.
Estas organizações podem
receber delegação do Conselho Nacional de Recursos Hídricos, por prazo
determinado, para exercer as funções de Agência de Água.
Nesse sentido, a Agência de
Bacia ou Consórcio operacionaliza, executa e gerencia as decisões do Comitê.
Apesar de possuírem funções distintas, ambos são responsáveis pela discussão,
consolidação e operacionalização da descentralização, estipuladas pelas
políticas de recursos hídricos.
Diante do exposto, percebe-se
que a gestão da bacia hidrográfica exige a cooperação dentro de sua abrangência
de todas as partes interessadas.
Quanto maior a extensão, maior
se torna a complexidade deste processo de cooperação, tendo em vista
divergências culturais, políticas e institucionais, além de diferenças de
concepção sobre os usos das águas (VAN LEUSSEN et al., 2007). (ecodebate)
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