Relatório do IPCC e o efeito perverso entre produção
de alimentos e mudanças climáticas.
“De
pé ó vítimas da fome; De pé famélicos da terra” - Hino da Internacional
Socialista.
O relatório “Climate Change and
Land”, do Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas (IPCC) da ONU,
publicado dia 08 de agosto de 2019, trata da conexão entre o uso da terra e
seus efeitos sobre a mudança climática. Existe um efeito perverso de
retroalimentação, pois a produção de alimentos aumenta o aquecimento global,
enquanto as mudanças climáticas decorrentes ameaçam a produção de alimentos.
O relatório mostra, de forma
inquestionável, que o crescimento da população mundial e o aumento do
consumo per capita de alimentos (ração, fibra, madeira e energia) têm causado
taxas sem precedentes de uso de terra e água doce, com a agricultura atualmente
respondendo por cerca de 70% do uso global de água doce.
O aumento da produção e consumo
de alimentos contribuíram para o aumento das emissões líquidas de gases de
efeito estufa (GEE), perda de ecossistemas naturais e diminuição da
biodiversidade. O sistema alimentar responde por cerca de 30% de todas as
emissões de gases de efeito estufa (GEE) e 80% do desmatamento global. A
humanidade ocupa cada vez mais espaço no mundo, com as áreas ecúmenas
deslocando e minguando as áreas anecúmenas, conforme mostra a figura abaixo
(FSP, 08/08/2019), com base no relatório do IPCC. A agricultura e a pecuária
ocupam cada vez mais espaço no mundo e ao acelerar o aquecimento global afeta
as florestas virgens, as áreas de savana e contribui para o aumento do degelo e
a elevação do nível dos oceanos.
O relatório do IPCC foi
resultado de dois anos de trabalho de 103 cientistas de 52 países, que
participaram voluntariamente do estudo. Antes do seu lançamento, o relatório
foi discutido com os governos no início de agosto em Genebra, na Suíça, e
aprovado por consenso por todos os países que participam do IPCC.
Segundo o site DW (08/08/2019):
“O relatório aponta que, se o aquecimento global ultrapassar o limite de 2ºC
estabelecido pelo Acordo de Paris, provavelmente as terras férteis se transformarão
em desertos, as infraestruturas vão se desmoronar com o degelo do permafrost, e
a seca e os fenômenos meteorológicos extremos colocarão em risco o sistema
alimentar. É um quadro sombrio, mas os autores do IPCC enfatizam que as
recomendações do relatório poderiam ajudar os governos a prevenir os piores
danos, reduzindo a pressão sobre a terra e tornando os sistemas alimentares
mais sustentáveis, enquanto atendem às necessidades de uma população
crescente”.
O fato é que o progresso da
“revolução verde” e a maior disponibilidade de alimentos – incluindo proteína
animal – viabilizaram o crescimento da população mundial, mas, ao mesmo tempo,
aceleraram a degradação dos solos e das fontes de água e agravaram o problema
do aquecimento global. O mundo consegue alimentar quase 8 bilhões de pessoas,
mas o custo ambiental é terrível. Por exemplo, a contribuição da pecuária para
a emissão de GEE é cada vez maior. Diminuir o consumo de carne é fundamental
para mitigar as emissões e também para a defesa dos direitos dos animais.
O relatório do IPCC adverte que
a demanda global por solo e água já acontece de forma insustentável e o
acréscimo de mais 3 bilhões de pessoas até o fim do século vai trazer desafios
ainda maiores. Ao desmatar e eliminar animais e plantas a um ritmo
impressionante, os seres humanos estão acelerando o colapso climático. A
seguir, as principais conclusões (segundo o site Página 22) :
“Caso as emissões não sejam controladas, uma crise alimentar estará
próxima, especialmente nas regiões tropicais e subtropicais”. O aumento das
temperaturas também pode afetar o valor nutricional das culturas e reduzir
significativamente o rendimento das culturas.
Os impactos climáticos já são
severos. Ondas de calor e secas tornaram-se mais frequentes e intensas em algumas
regiões, e a segurança alimentar já foi prejudicada por afetar o rendimento das
colheitas e a produção animal, entre muitas outras mudanças como resultado da
crise climática.
Projeta-se que uma combinação
de elevação do nível do mar e ciclones mais intensos ponha em risco vidas e
meios de subsistência em áreas propensas a ciclones. O aquecimento já criou
risco de incêndios florestais e estes devem se tornar um alto risco a partir de
1,5°C de aquecimento.
A agricultura, a produção de
alimentos e o desmatamento são fatores significativos da mudança climática e
produzem cerca de 23% das emissões de gases de efeito estufa induzidas pelo
homem.
Diferentemente do setor de
combustíveis fósseis, a agricultura sustentável poderia ser parte da solução
para o aquecimento global, ao retirar carbono da atmosfera e colocá-lo no solo.
Mas a janela de oportunidade está se fechando rapidamente, pois a capacidade
dos solos de realizar essa função diminui à medida que a temperatura aumenta.
O progresso inicial em direção
a uma ampla transformação da agricultura, silvicultura e uso da terra é
necessário para alcançar as metas do Acordo de Paris. Essa transformação
precisa estar bem encaminhada até 2040.
Existem muitas soluções em que
todos ganham no setor da terra, particularmente na agricultura e silvicultura,
mas algumas soluções terrestres para o aquecimento global, como BECCS
(bioenergia com captura e sequestro de carbono) podem forçar trade-offs com
produção de alimentos se não forem feitas com cautela ou em escalas inadequadas.
A escassez de água em regiões
secas será um desafio cada vez mais urgente, além de um aumento global de
temperatura de 1,5°C.
“Mudanças climáticas e eventos
climáticos extremos relacionados podem intensificar a migração através das
fronteiras e dentro dos países”.
Em síntese, o avanço científico
e tecnológico aliado ao uso generalizado dos combustíveis fósseis reduziu a
fome no mundo, que atingiu o nível mais baixo da história. Porém, a insegurança
alimentar e a desnutrição global aumentou nos últimos 3 anos e pode aumentar
muito no futuro próximo. A biocapacidade da terra está diminuindo e os meios
naturais para o sustento da humanidade estão definhando.
Por isto é preciso levar em
conta que o progresso humano está levando o mundo para a beira de um precipício
em função de uma catástrofe ambiental cada vez mais provável. Para satisfazer a
gula de poucos e matar a fome de muitos, destrói-se a vida no Planeta.
Um mundo de desperdício.
Entregamos ao lixo mais de mil milhões de toneladas de alimentos por ano.
(ecodebate)
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