Soja contribuiu para 10% do
desmatamento na América do Sul em 20 anos, mostra estudo.
A soja foi responsável por
10% do desmatamento ocorrido em duas décadas na América do Sul, indica novo
estudo. Apesar de ficar atrás da pecuária bovina em áreas devastadas
diretamente, o cultivo do grão teve papel central na dinâmica de especulação
fundiária que incentiva o desmate: só no Brasil, o país com maior destruição de
biomas (notadamente Cerrado e Amazônia), dobrou o número de área dedicado ao
plantio no mesmo período. O processo tende a ser parecido: compram-se terras em
fronteira agrícola, "empurrando" assim o boi para dentro de áreas de
mata, em uma trilha de destruição do verde.
Para mapear o Brasil, o trabalho contou com a participação do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (INPE) e da Companhia Nacional de Abastecimento (Conab).
De toda a conversão de mata em soja observada no período estudado, 53% ocorreram por influência "direta" da soja (a plantação ocupou a área desmatada em menos de 3 anos) e os outros 47% como influência "latente" da soja (em mais de 3 anos). Segundo os pesquisadores, um fator muito revelador sobre o papel da soja no desmatamento é a localidade das novas lavouras, mais do que a quantidade delas. Mesmo quando não estavam desmatando diretamente, a maioria dos novos campos de soja estão perto de quem está desmatando.
"A descoberta mais
importante do nosso estudo está ligada à atribuição da soja como causa
precedente da derrubada de florestas no contexto de perda total de floresta na
América do Sul", afirma Hansen.
Avanço da soja
Mapa mostra extensão de
plantações do grão em 2001 e 2020 em cada bioma sul-americano.
Áreas escuras nos biomas concentram o avanço.
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Os cientistas reconhecem a
pecuária como um impulso mais imediato por trás do desmatamento, e afirmam que
os 10% da devastação atribuídos à soja podem até parecer pouco. Esse cultivo,
porém, frisam, tem papel sistêmico nas causas de derrubada da floresta.
"Apesar de a proporção
ser relativamente pequena, essas terras são altamente concentradas em
fronteiras ativas de desmatamento", dizem os pesquisadores.
"Geralmente, a soja substitui terras de pastagem, e podemos esperar que
essa dinâmica continue".
O bioma que mais acomodou
novas áreas de plantio do grão foi o cerrado brasileiro, onde está metade das
lavouras iniciadas neste século no continente. Outras áreas onde a soja ganhou
extenso terreno foram o leste da bacia do Xingu, no Mato Grosso, e o sul do
Maranhão. No Paraguai, a região do Chaco, bioma único, teve grande crescimento
da área cultivada, bem como a Chiquitania, área de savana da Bolívia.
Moratória na Amazônia
Para tentar frear o avanço da
sojicultura na Amazônia, especificamente, governos e sociedade civil costuraram
há uma década e meia um acordo com as empresas distribuidoras de grãos. A
iniciativa teve um sucesso razoável.
"Não está nos
compromissos da Abiove fixar uma data de corte abrupta, que resulte na exclusão
de produtores de soja sem que tenham oportunidade para direcionar o crescimento
da produção em áreas já consolidadas e que voluntariamente optarem pela
conservação", afirmou a empresa em nota ao GLOBO. "A pegada de
desmatamento da expansão da soja no Cerrado está caindo e é atualmente a mais
baixa em 19 anos”. De uma expansão de 5,8 milhões de hectares na área plantada
de soja da safra 2013-14 até 2019-20, apenas 8% foram em área desmatada e 92%
em áreas já abertas. (...) O Brasil é o maior produtor e exportador mundial de
soja e usa cada vez menos áreas de vegetação nativa."
Estudo da Universidade
Federal de Minas Gerais (UFMG) do ano passado, no entanto, estimou que 20% da
soja exportada pelo Brasil ainda em 2018 tinham ligação com áreas de mata
derrubada. Segundo Britaldo Soares-Filho, um dos líderes do grupo, os números
dos cientistas divergem com os da indústria porque esta não contabiliza como
problema a soja oriunda de propriedades desmatada se a área de mata derrubada
ainda não está plantada. Muitos sojeiros, porém, desmatam suas terras para
pastagem, outros cultivares ou para pura especulação.
“A soja e o gado costumam ser
descritos como vetores do desmate, mas na verdade a causa do desmate é a busca
pela terra. A soja e o gado são companheiros desse processo”, diz o pesquisador
da UFMG.
Segundo o grupo liderado por Hansen, mesmo buscando evitar uma influência prejudicial na dinâmica fundiária do continente, é preciso cautela para evitar que os efeitos colaterais da presença da soja não sejam transferidos para outras áreas, como o Pantanal. Por causa disso, cientistas não têm aceitado todos os números que a indústria levanta.
"Atingir uma cadeia produtiva de commodity para a soja que seja livre de desmatamento requer a consideração de como expandir sua área de produção sem impulsionar indiretamente o desmatamento ao aumentar a demanda por terras de pastagem ou outros usos da terra", escrevem os cientistas no estudo. (biodieselbr)
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