A maior parte da pegada
ecológica é emissão de CO2. Se a China zerar as emissões líquidas e
reduzir o tamanho da população poderá diminuir o seu déficit ambiental.
“Idade da Pedra não acabou
por falta de pedras, a Era do Petróleo chegará ao fim, não por falta de óleo” -
Ahmed-Zaki Yamani.
A China é o maior importador
de combustíveis fósseis e o maior emissor de gases de efeito estufa do mundo.
Portanto, o “Império do Meio” depende de acordos geopolíticos para garantir o
fornecimento de petróleo e gás, além de pagar um alto custo pela poluição e a
degradação do meio ambiente.
Pelo lado ambiental, o foco
do presidente Xi Jinping tem sido nas metas de pico de emissões antes de 2030 e
líquido zero até 2060, em linha com o espírito do Acordo de Paris. As
principais metas ambientais do governo para seu atual plano de cinco anos são
reduzir o consumo de energia por unidade do PIB em 13,5% até 2025 e a
intensidade de carbono em 18% no mesmo período.
Assim, diversificar as fontes
de energia é uma necessidade ecológica, mas também visa aumentar a eficiência
por razões geoestratégicas. O 14º Plano Quinquenal no início deste ano aliou a
ambição verde ao foco na recuperação econômica e na segurança, com referências
ao uso eficiente do carvão, à expansão dos estoques de petróleo e gás e à
exploração doméstica. A China tem procurado construir sua Reserva Estratégica
de Petróleo. Todavia, o abandono dos hidrocarbonetos é uma mudança em direção a
alternativas nas quais Pequim tem um controle mais estreito da cadeia de
abastecimento.
Porém, essa mudança não será
instantânea. O consumo de energia da China aumentou no ano passado, mesmo com a
pandemia que provocou uma queda em todo o mundo. A indústria pesada chinesa tem
tido dificuldade para descarbonizar a produção. A Administração Nacional de
Energia foi criticada por ser muito frouxa para evitar novas usinas de carvão –
o combustível fóssil mais sujo – que ainda é responsável por mais da metade da
matriz energética do país em 2021. Recentemente, a China tomou a decisão
histórica de vender parte do petróleo que estocou em uma reserva estratégica há
anos.
Abandonar o petróleo e carvão
não vai ser fácil para o país. Em setembro/2021, a China viveu uma crise
energética grave e vários setores da indústria e dos serviços estão tendo de
paralisar as atividades por falta de energia. Com os blecautes provocados pela
escassez do suprimento de carvão, vários governadores de províncias pedem para
o país importar carvão e afrouxar as metas ambientais.
Assim, fica claro que Pequim
ainda ficará dependente da energia movida a carvão enquanto o crescimento
econômico continuar sendo prioridade. Isto quer dizer que a mudança pode vir
muito tarde, pois a crise climática já está mostrando imediatamente os danos no
mundo todo. A China pretende gastar menos com importação de combustíveis
fósseis e lucrar mais com a exportação de tecnologias verdes. Ou seja, as
perspectivas de mudança energética são positivas, mas se o caminho da transição
for longo poderá ter muitos impactos climáticos indesejados.
O gráfico abaixo mostra que a China tinha superávit ecológico no primeiro quinquênio da década de 1960, mas passou a ter déficits crescentes e chegou em 2017 com uma pegada ecológica per capita de 3,7 hectares globais (gha), para uma biocapacidade per capita de 0,92 gha. O déficit ecológico foi de 303%. O desafio é inverter a curva da pegada ecológica o mais rápido possível.
Indubitavelmente, a China já vive muito acima dos seus meios e de seus recursos naturais, contribuindo para o desequilíbrio ambiental do Planeta. O desafio da sustentabilidade requer respostas complexas e soluções múltiplas. Sem dúvida, uma tarefa inadiável é promover o avanço tecnológico, a mudança da matriz energética, revolucionar a produção de alimentos e esforçar para o desacoplamento entre produção e recursos naturais. Mas isto só não basta. É preciso também reduzir a pegada ecológica e o número de “pés”, isto é, diminuir o consumo conspícuo e o número de consumidores. Neste ponto, a China será o primeiro dos 10 países mais populosos a iniciar o decrescimento demográfico (a população chinesa vai começar a diminuir no máximo até 2025 e deve haver uma redução de cerca de 400 milhões de habitantes até 2100).
A maior parte da pegada
ecológica é emissão de CO2. Se a China zerar as emissões líquidas e
reduzir o tamanho da população poderá diminuir o seu déficit ambiental. Mas
precisará também mudar o paradigma do crescimento econômico desregrado e se
preocupar menos com o tamanho do PIB (inclusive reduzindo gastos militares) e
mais com a qualidade de vida humana e ambiental. Adicionalmente, a China pretende
liderar o mundo na nova matriz energética que inclui a produção de equipamentos
e grandes montantes de energia renovável, mas também veículos elétricos e a eletrificação
dos meios de transporte.
As energias renováveis estão aumentando em todo o mundo, mas não suficientemente para evitar a expansão dos combustíveis fósseis. O gráfico abaixo, da REN21 (junho 2021) mostra que mesmo com toda a expansão das energias renováveis (que passaram de 8,7% para 11,2% no consumo final de energia global) os combustíveis fósseis continuam crescendo em termos absolutos (embora tenham mantido praticamente o mesmo percentual).
Desta forma, fica claro que não basta apenas avançar com as energias renováveis. Certamente a China vai buscar hegemonizar o novo padrão de produção internacional, pois só os negacionistas acreditam na Terra plana e infinita. Mas além de mudar o padrão global de produção e consumo é preciso planejar o decrescimento demoeconômico (redução da pegada ecológica). Desta forma, superar a Era dos combustíveis fósseis é essencial e inadiável. Como mostra Jason Hickel: “Menos é mais”. A China e o mundo precisam de menos poluição e mais regeneração ambiental. Menos humanosfera e mais ecoesfera! (ecodebate)
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