quinta-feira, 23 de novembro de 2023

Mudança climática influencia onda de calor mais do que El Niño

Mudança climática influenciou a onda de calor mais do que o El Niño.
Elaborado por pesquisadores brasileiros, europeus e norte-americanos, estudo de atribuição quantificou contribuição do aquecimento global para o episódio que elevou as temperaturas para mais de 40°C no Brasil.

Estudo publicado em 10/10/23 pela iniciativa World Weather Attribution concluiu que a influência da mudança do clima foi muito maior do que o atual fenômeno El Niño para a ocorrência de extremos de temperatura que atingiu a região central do Brasil.

Onda de calor registrada em setembro foi a responsável por recordes temperatura para o período dos últimos 63 anos em São Paulo e Cuiabá.

Segundo a análise, assinada por 12 autores, incluindo pesquisadores brasileiros, europeus e norte-americanos, a onda de calor do início da primavera foi ao menos 100 vezes mais provável devido à mudança do clima causada pela ação humana.

“Enquanto muitas pessoas relacionam o El Niño para explicar a onda de calor em partes da América do Sul, esta análise apresenta que a mudança do clima é um dos fatores principais para a intensidade e a magnitude do calor. Nós queremos ser claros, o fenômeno El Niño poderia ter contribuído com algum calor, mas sem a mudança do clima, a intensidade da onda de calor da primavera não seria tão intensa”, afirmou o pesquisador do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe), Lincoln Alves.

A onda de calor extremo analisada compreendeu o período de 17 a 26 de setembro, período esse onde uma grande massa de ar quente prevaleceu nas regiões sudeste e centro-norte do país. O pico de calor foi registrado em 25/09/23, com anomalias de temperatura 7°C acima da média para o período, como foi registrado no sul da Bahia, leste de Goiás e Mato Grosso do Sul, e norte do Paraná. Além disso, um domo de calor se instalou entre o Paraguai e o meio-este e sudeste do Brasil.

Com ajuda de três bases de dados e de multi-modelos climáticos, os pesquisadores analisaram a onda de calor em uma área territorial que abrange, além do Brasil, Paraguai, Bolívia e Argentina. Eles também analisaram os dados sobre temperaturas máximas em São Paulo entre 1961 e 2023 a partir de dados do Instituto Nacional de Meteorologia (Inmet).

Para conseguir atribuir o calor extremo à mudança do clima, os pesquisadores calcularam o período de retorno, mudança na intensidade e razão de probabilidade entre 2023 e um clima com 1.2°C mais frio, ou seja, sem o aquecimento global antropogênico. De acordo com o estudo, todos os três conjuntos de dados mostram um claro aumento na frequência e intensidade de eventos quentes.

Para a análise, os pesquisadores selecionaram o período de retorno de 30 anos. Os dados indicaram que a intensidade, ou magnitude, de um evento de 10 dias que aconteceu em 2023 teria sido muito menor no passado. Além disso, eles calcularam que o evento de calor foi aproximadamente um evento de 1 em 30 anos no clima de hoje, ou seja, considerando o aquecimento global.

O pesquisador do Instituto Meteorológico Real dos Países Baixos, Izidine Pinto, destacou que não foi calculado o percentual exato de contribuição de cada fenômeno – El Niño e mudança do clima. Contudo, segundo ele, as contribuições do El Niño foram inferiores às da mudança do clima.

Com o aquecimento global, a perspectiva é de que ondas de calor se tornarão ainda mais comuns e com extremos de temperatura cada vez maiores. A temperaturas médias globais de 2°C acima dos níveis pré-industriais, um evento de calor como este será cerca de cinco vezes mais provável e 1,1 a 1,6°C mais quente do que hoje.

2024 poderá ser ainda mais quente que este ano, com a influência do El Niño.

O perigo das ondas de calor

Segundo especialistas, ondas de calor são a principal causa de mortes no mundo associadas a eventos extremos. No verão europeu de 2022, mais de 61 mil pessoas morreram de calor, de acordo com as estimativas do Instituto de Saúde Global de Barcelona divulgadas em julho/23.

Os pesquisadores defendem que os impactos humanos podem ser evitáveis por meio da execução de planos de adaptação ao calor extremo, evitando redução da morbidade e mortalidade. A diretora do Cento de Clima da Cruz Vermelha, Julie Arrighi, destacou que muitos locais ainda não dispõem de planos de adaptação, mas que “cidades e governos ao redor do mundo estão tentando desenvolver planos de ação”. Ela citou o plano de ação desenvolvido por Paris, que envolve longo prazo e ações de baixo custo. Entre os exemplos está a possibilidade de fontes de água serem abertas ao público em momentos de calor para que a população possa se refrescar.

Estudos de atribuição

Os estudos de atribuição ainda são poucos no Brasil. A atribuição é quanto um fator contribuiu para a ocorrência de um fenômeno. De acordo com o pesquisador Lincoln Alves, a proposta é analisar o evento extremo logo após o ocorrido e seguindo protocolos muito bem definidos para sensibilizar a sociedade sobre o que está acontecendo.

A mudança climática atual poderia causar um "El Niño permanente"?

Fundada em 2015, a iniciativa World Weather Attribution conta com colaboração internacional para analisar e comunicar a possível influência da mudança do clima em eventos climáticos extremos, como tempestades, extremos de precipitação, ondas de calor e secas. Mais de 50 estudos de atribuição já foram realizados pela iniciativa. (ecodebate)

Nenhum comentário:

Grandes empresas fósseis contribuíram em dezenas de ondas de calor

180 grandes empresas fósseis contribuíram para dezenas de ondas de calor globais. Grandes petrolíferas intensificaram 213 ondas de calor m...