quarta-feira, 23 de outubro de 2013

Explosão, implosão ou divisão demográfica?

A dinâmica demográfica mundial está ficando cada vez mais complexa. Existe um grupo de países que apresenta altas taxas de fecundidade, outro grupo que possui fecundidade em torno do nível de reposição (2,1 filhos por mulher) e um terceiro grupo que apresenta taxas de fecundidade muito baixas.
As duas primeiras décadas após o fim da Segunda Guerra Mundial foi marcada pelo baby boom e a redução das taxas de mortalidade infantil. Foi nesta época que o crescimento da população mundial ultrapassou 2% ao ano, gerando diversas preocupações com a explosão populacional.
Mas as taxas de fecundidade começaram a cair na maioria dos países do mundo em decorrência dos avanços na urbanização, na educação, na saúde (especialmente na saúde reprodutiva) e com a entrada das mulheres no mercado de trabalho e o empoderamento feminino.
A ideia inicial da transição demográfica era de que as taxas de fecundidade cairiam até o nível de reposição, mantendo-se estáveis em torno de 2 filhos, o que geraria a estabilização da população dos países e do mundo.
Porém, em um grupo grande de países (não só aqueles de renda alta, mas países de renda média como a Ucrânia, Tailândia, Cuba, etc.) as taxas de fecundidade continuaram caindo até níveis muito abaixo da reposição (lowest-low fertility). Isto fez surgir a preocupação com o baby bust e com a chamada implosão demográfica ou inverno demográfico.
Evidentemente, os termos explosão e implosão não possuem conotação científica e são usados mais pela mídia e pelos políticos para vender as propostas de programas controlistas ou natalistas. Porém, as posturas ideológicas acabam se infiltrando na academia, o que prejudica uma análise mais aprofundada da dinâmica demográfica mundial.
Na verdade a dinâmica demográfica mundial é bastante complexa e podemos dizer que – segundo dados da UNDP e da Divisão de População da ONU – existem pelo menos três grupos (clusters) de países:
Aqueles com taxas de fecundidade (TFT) abaixo de 2,1 filhos por mulher;
Aqueles com taxas de fecundidade entre 2,1 e 3,0 filhos por mulher;
Aqueles com taxas de fecundidade acima de 3,0 filhos por mulher.
No primeiro grupo, em 2010, havia 27 países com taxas de fecundidade abaixo de 1,5 filho por mulher. Se esta tendência continuar por dois ou três séculos haveria uma redução drástica da população destes países (quase todos classificados como desenvolvidos). No segundo grupo, a fecundidade está pouco acima do nível de reposição com perspectiva de estabilização. No terceiro grupo, em 2010, havia 25 países com taxas de fecundidade acima de 5 filhos por mulher, significando a possibilidade de um crescimento exponencial da população neste conjunto de países (todos de baixa renda).
Portanto, a dinâmica demográfica mundial, neste início do século XXI, está marcada pela heterogeneidade, fornecendo exemplos para quem fala de explosão populacional, implosão populacional ou estabilização da população.
A ideia de que o processo de desenvolvimento iria gerar uma situação de estabilidade demográfica não tem se confirmado, pois alguns países se encontram na “armadilha da pobreza” com renda baixa e alta fecundidade, alguns estão na chamada “armadilha da baixa fecundidade” e outros estão próximos da estabilização. Neste sentido, alguns pesquisadores consideram que não se pode tratar as diversidades nacionais de maneira unificada e falam em “divisão demográfica mundial” ou “fosso demográfico” entre os países.
Há muita controvérsia mesmo quanto ao futuro do primeiro grupo, formado pelos países com fecundidade abaixo do nível de reposição.
Escritores, como Jonathan Last, no livro What to Expect When No One’s Expecting: America’s Coming Demographic Disaster, consideram que taxas de fecundidade muito baixas provocam a ruína dos países, pois diminuem o montante da força de trabalho disponível no mercado e aumentam a razão de dependência de idosos, provocando perda de produtividade e déficits fiscais crescentes. Nesta linha de raciocínio estão a maioria dos pesquisadores assustados com a “implosão populacional”.
Em outro extremo há pesquisadores que acreditam que o baby bust é temporário e que os países desenvolvidos estariam na iminência de um novo baby boom.
O economista Peter Berezin, da BCA Research, lançou recentemente um artigo denominado The Coming Baby Boom in Developed Economies, onde defende a ideia de que os países desenvolvidos estariam prestes a experimentar um período de aumento da natalidade, o que provocaria um baby boom mais intenso e duradouro do que o que se seguiu à Segunda Guerra Mundial. Indo contra as as projeções de longo prazo dos governos e da ONU, Berezin considera que não existe a tal “implosão demográfica” e muito menos os graves problemas de baixa produtividade e aumento da dependência de idosos. Ele até projeta um superavit fiscal de 4% do PIB para os EUA no final do corrente século.
Já o artigo High development and fertility: fertility at older reproductive ages and gender equality explain the positive link, (2011), dos demográfos Myrskylä, Mikko; Kohler, Hans Peter & Billari, Francesco – o qual serviu de inspiração para Peter Berezin – mostra que a fecundidade de coorte tem sido sempre maior do que a fecundidade de período, significando que o fenômeno do baby bust não é tão grave quando pintado pelos “implosicionistas”.
Ou seja, existe um grupo de países com fecundidade muito baixa (dando argumento para as ideias da “implosão demográfica”), existe um grupo onde a fecundidade está próxima do nível de reposição (dando argumento para quem defende a estabilização da população) e existe um grupo de países com fecundidade muito elevada (dando argumento para as ideias da “explosão demográfica”).
Desta forma, o mundo vive hoje uma situação demográfica complexa, pois existem tendências conflitantes e até opostas na dinâmica populacional, sendo que nada pode ser considerado definitivo e irreversível. No curto prazo, o quadro é claro e a população mundial deve chegar a 8 bilhões de habitantes até 2025. Mas no longo prazo, os cenários estão totalmente abertos e a população mundial pode estabilizar, ter um grande crescimento ou um grande decrescimento. Só o tempo vai mostrar para onde irá as tendências demográficas e se o quadro internacional vai ficar mais homogêneo ou mais heterogêneo. (EcoDebate)

Nenhum comentário:

Degradação florestal na Amazônia afeta área três vezes maior que desmatamento

Entre março de 2023 e de 2024, INPE detectou aviso de degradação para 20,4 mil km², maior que os 18 mil km² do período anterior. É necessári...