A dinâmica demográfica mundial está ficando cada vez mais
complexa. Existe um grupo de países que apresenta altas taxas de fecundidade,
outro grupo que possui fecundidade em torno do nível de reposição (2,1 filhos
por mulher) e um terceiro grupo que apresenta taxas de fecundidade muito
baixas.
As duas primeiras décadas após o fim da Segunda Guerra
Mundial foi marcada pelo baby boom
e a redução das taxas de mortalidade infantil. Foi nesta época que o
crescimento da população mundial ultrapassou 2% ao ano, gerando diversas
preocupações com a explosão populacional.
Mas as taxas de fecundidade começaram a cair na maioria dos
países do mundo em decorrência dos avanços na urbanização, na educação, na
saúde (especialmente na saúde reprodutiva) e com a entrada das mulheres no
mercado de trabalho e o empoderamento feminino.
A ideia inicial da transição demográfica era de que as taxas
de fecundidade cairiam até o nível de reposição, mantendo-se estáveis em torno
de 2 filhos, o que geraria a estabilização da população dos países e do mundo.
Porém, em um grupo grande de países (não só aqueles de renda
alta, mas países de renda média como a Ucrânia, Tailândia, Cuba, etc.) as taxas
de fecundidade continuaram caindo até níveis muito abaixo da reposição (lowest-low fertility). Isto fez
surgir a preocupação com o baby bust
e com a chamada implosão demográfica ou inverno demográfico.
Evidentemente, os termos explosão e implosão não possuem
conotação científica e são usados mais pela mídia e pelos políticos para vender
as propostas de programas controlistas ou natalistas. Porém, as posturas
ideológicas acabam se infiltrando na academia, o que prejudica uma análise mais
aprofundada da dinâmica demográfica mundial.
Na verdade a dinâmica demográfica mundial é bastante
complexa e podemos dizer que – segundo dados da UNDP e da Divisão de População
da ONU – existem pelo menos três grupos (clusters)
de países:
Aqueles com taxas de fecundidade (TFT) abaixo de 2,1 filhos
por mulher;
Aqueles com taxas de fecundidade entre 2,1 e 3,0 filhos por
mulher;
Aqueles com taxas de fecundidade acima de 3,0 filhos por
mulher.
No primeiro grupo, em 2010, havia 27 países com taxas de
fecundidade abaixo de 1,5 filho por mulher. Se esta tendência continuar por
dois ou três séculos haveria uma redução drástica da população destes países
(quase todos classificados como desenvolvidos). No segundo grupo, a fecundidade
está pouco acima do nível de reposição com perspectiva de estabilização. No terceiro
grupo, em 2010, havia 25 países com taxas de fecundidade acima de 5 filhos por
mulher, significando a possibilidade de um crescimento exponencial da população
neste conjunto de países (todos de baixa renda).
Portanto, a dinâmica demográfica mundial, neste início do
século XXI, está marcada pela heterogeneidade, fornecendo exemplos para quem
fala de explosão populacional, implosão populacional ou estabilização da
população.
A ideia de que o processo de desenvolvimento iria gerar uma
situação de estabilidade demográfica não tem se confirmado, pois alguns países
se encontram na “armadilha da pobreza” com renda baixa e alta fecundidade,
alguns estão na chamada “armadilha da baixa fecundidade” e outros estão
próximos da estabilização. Neste sentido, alguns pesquisadores consideram que
não se pode tratar as diversidades nacionais de maneira unificada e falam em
“divisão demográfica mundial” ou “fosso demográfico” entre os países.
Há muita controvérsia mesmo quanto ao futuro do primeiro
grupo, formado pelos países com fecundidade abaixo do nível de reposição.
Escritores, como Jonathan Last, no livro What to Expect When No One’s Expecting:
America’s Coming Demographic Disaster, consideram que taxas de
fecundidade muito baixas provocam a ruína dos países, pois diminuem o montante
da força de trabalho disponível no mercado e aumentam a razão de dependência de
idosos, provocando perda de produtividade e déficits fiscais crescentes. Nesta
linha de raciocínio estão a maioria dos pesquisadores assustados com a “implosão
populacional”.
Em outro extremo há pesquisadores que acreditam que o baby bust é temporário e que os
países desenvolvidos estariam na iminência de um novo baby boom.
O economista Peter Berezin, da BCA Research, lançou
recentemente um artigo denominado The
Coming Baby Boom in Developed Economies, onde defende a ideia de que os
países desenvolvidos estariam prestes a experimentar um período de aumento da
natalidade, o que provocaria um baby
boom mais intenso e duradouro do que o que se seguiu à Segunda Guerra
Mundial. Indo contra as as projeções de longo prazo dos governos e da ONU,
Berezin considera que não existe a tal “implosão demográfica” e muito menos os
graves problemas de baixa produtividade e aumento da dependência de idosos. Ele
até projeta um superavit fiscal de 4% do PIB para os EUA no final do corrente
século.
Já o artigo High
development and fertility: fertility at older reproductive ages and gender
equality explain the positive link, (2011), dos demográfos Myrskylä,
Mikko; Kohler, Hans Peter & Billari, Francesco – o qual serviu de
inspiração para Peter Berezin – mostra que a fecundidade de coorte tem sido
sempre maior do que a fecundidade de período, significando que o fenômeno do baby bust não é tão grave quando
pintado pelos “implosicionistas”.
Ou seja, existe um grupo de países com fecundidade muito
baixa (dando argumento para as ideias da “implosão demográfica”), existe um
grupo onde a fecundidade está próxima do nível de reposição (dando argumento
para quem defende a estabilização da população) e existe um grupo de países com
fecundidade muito elevada (dando argumento para as ideias da “explosão
demográfica”).
Desta forma, o mundo vive hoje uma situação demográfica
complexa, pois existem tendências conflitantes e até opostas na dinâmica
populacional, sendo que nada pode ser considerado definitivo e irreversível. No
curto prazo, o quadro é claro e a população mundial deve chegar a 8 bilhões de
habitantes até 2025. Mas no longo prazo, os cenários estão totalmente abertos e
a população mundial pode estabilizar, ter um grande crescimento ou um grande
decrescimento. Só o tempo vai mostrar para onde irá as tendências demográficas
e se o quadro internacional vai ficar mais homogêneo ou mais heterogêneo.
(EcoDebate)
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