Estranho
falar sobre água, parece um assunto menor diante de tantas outras necessidades,
como o famoso tripé: saúde, educação e segurança. Mas não se engane, é um
assunto de igual relevância.
Quando
perguntam sobre o meu trabalho, respondo rápido: “- Trabalho com gestão de
recursos hídricos.”. Frequentemente ouço de volta: “- Ah, essas coisas de meio
ambiente?”. Por amor ao que faço, e não é fácil falar de amores, retruco como
quem defende a amada: “- Não. Eu trabalho com recursos hídricos.”. Faço questão
de explicar que gestão de recursos hídricos tem objetivos e princípios
diferentes da gestão ambiental, que ela não é melhor nem pior, apenas
diferente, que elas devem ser integradas, mas que não se sobrepõem.
Que
esse sistema de gestão, por ser moderno, descentralizado e participativo, se
tiver a estrutura e o apoio necessários ao seu bom funcionamento, pode dar
suporte às questões ambientais e ser um dos pilares da tão falada e necessária
sustentabilidade.
Ciclo
das águas
1 Evaporação
2 Condensação
3 Chuva e/ou derretimento de neves
4 Agua entrando nas rochas e solos
5 Chuva nos oceanos
6 Evotranspiração das plantas (perda
de água de uma comunidade ou ecossistema para a atmosfera, causada pela
evaporação a partir do solo e pela transpiração das plantas)
7 Lençol freático
Que
a sua função é decidir o que fazer com esse recurso, um bem público, que tem
disponibilidade limitada. Que a gestão é feita de forma democrática, por meio
dos Comitês de Bacias Hidrográficas, com a participação de representantes do
poder público, dos usuários e da sociedade, e que a política que rege essa
gestão dispõe de instrumentos para planejar, orientar e controlar os usos,
respeitando todos os interesses e necessidades, e fazendo com que esse recurso,
escasso, atenda as demandas atuais e futuras, em quantidade e qualidade.
Diante
de testas franzidas, arremato diferenciando água de recursos hídricos. Que
“água” é a substância química composta de hidrogênio e oxigênio, essencial a
todas as formas conhecidas de vida na Terra, que está dispersa na natureza, no
nosso corpo, rios, nuvens etc, e se transforma em recurso, “recurso hídrico”,
quando está relacionada a algum uso, como: abastecimento público, indústria,
irrigação, geração de energia, transporte, turismo, entre outros.
Reconheço
a complexidade do assunto, mas deixo claro que não é coisa nova, muito menos
loucura ou invencionice para tirar a importância ou o foco de outras
discussões.
Creio
que parte da estranheza de se falar em gestão de recursos hídricos, vem do fato
de acharmos que a água é abundante, e que, por consequência, que não há
necessidade de gastar esforços ou dinheiro para gerir ou proteger algo que está
disponível com fartura. Quando me deparo com essa falsa percepção de
abundância, busco sempre extinguir esse mito, mostrando que, além de ter a
disponibilidade restrita, ela é um dos principais insumos de qualquer processo
produtivo, imprescindível a todas as atividades exercidas pelo homem. Por isso,
todos são usuários de recursos hídricos, desde uma pequena irrigação às usinas
hidrelétricas e nucleares.
Não
sou o único a pensar assim. Existem outros que também trabalham e se dedicam a
essa visão. E eu não falo de pessoas ou de lugares distantes. Falo do município
de Rio Verde, e do seu Ribeirão Abóboras, um projeto premiado e reconhecido
nacional e internacionalmente, que busca recuperar nascentes com o objetivo de
garantir água para o abastecimento da cidade e de seu importante polo
agroindustrial, e ainda remunera financeiramente os produtores rurais, que
passaram a ser conhecidos como “produtores de água”.
Falo
de pessoas que trabalham para que, num futuro breve, o manancial que abastecerá
grande parte da Região Metropolitana de Goiânia pelos próximos 20 a 25 anos, o
nosso Ribeirão João Leite, também tenha os seus “produtores de água”. Falo de
pessoas daqui, de representantes de Empresas Públicas, Secretarias e Agências,
servidores públicos que buscam soluções e recursos para garantir o nosso
futuro, que planejam, controlam e orientam os usos, com o objetivo de garantir
o seu melhor aproveitamento. Falo de representantes da sociedade, que dedicam
seu tempo a desenvolver conhecimentos sobre a água, contribuindo para a sua
recuperação, conservação e bom uso. Falo de representantes dos usuários, da
irrigação, da indústria, entre outros, que se mobilizam, não para pedir
facilidades ou flexibilizações, mas para auxiliar na evolução desse sistema e
contribuir para a garantia das condições necessárias à manutenção de suas
próprias atividades.
Mas,
e a água, José? Mesmo diante disso, infelizmente penso que estamos brincando
com o nosso futuro, pois não investimos nem utilizamos de forma adequada este
recurso, e estamos colocando em risco o desenvolvimento econômico e social da
nossa população, dos Municípios, do Estado e do País.
Não
estruturar e investir de forma maciça na gestão dos recursos hídricos é
entregar os nossos passos e das próximas gerações a uma incerteza no mínimo
cruel e perigosa. Nós, o Estado de Goiás e o Brasil, perdemos quando não
fortalecemos essa estrutura de gestão e deixamos sem o devido cuidado e
proteção um recurso tão precioso, que representa a diferença entre a existência
ou não de vida, a garantia de poder ou não se desenvolver, gerar ou não
riquezas.
Mas
e a água, José? Digo, e agora José? Fica tudo como no poema de Drummond: “…Você
marcha, José! José, para onde?”
Quem
sabe quando a água falte de vez, quando os conflitos estiverem definitivamente
instalados, quando os prejuízos ao desenvolvimento e à vida forem
irremediáveis, como já aconteceu e acontece em outros países e até em outras
regiões brasileiras, sendo causa de fome, doenças, pobreza, restrições ao desenvolvimento,
desabastecimento e até de guerras, alguém consiga fazer o que não temos
condições de fazer hoje: garantir boas condições para o presente e o futuro.
(ecodebate)
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