Uso de águas residuais é
prática antiga das famílias agricultoras do Semiárido.
As
famílias agricultoras do Semiárido brasileiro têm muito a ensinar sobre o tema
escolhido pela Organização das Nações Unidas (ONU) para o Dia Mundial da Água
deste ano: águas residuais – ou água servida, no jeito de falar das
agricultoras e agricultores da Paraíba. Atualmente, 80% das águas utilizadas
são descartadas na natureza. Se fossem reaproveitadas, a necessidade pela água
potável diminuiria, assim como seria reduzido também o volume de esgoto lançado
nos rios, lagos, mares.
Naturais
de uma região com um regime de chuva irregular e cada vez mais afetada pelas
mudanças climáticas, as famílias agricultoras precisam da água não só para
beber e para o uso doméstico. A água é fundamental para cultivarem seu
alimento, que também nutre outras tantas famílias suas freguesas nas feiras ou
na própria comunidade. Com acesso regrado ao recurso essencial à vida, as
famílias agricultoras sabem muito bem usar várias vezes a mesma água, sem
desperdiçar nenhuma gota.
“Na
região, as pessoas já trazem culturalmente esta prática pela dificuldade de
acesso à água. Quando elas passam a ter acesso à água, através das cisternas,
elas qualificam ainda mais esta prática devido à autonomia que ganham no uso do
recurso”, comenta marcos Jacinto, da coordenação executiva da ASA pelo estado
do Ceará.
Da
necessidade, surgiram formas criativas e de fácil aplicação para o
reaproveitamento de cada gota d´água que chega às propriedades das famílias
rurais do Semiárido. Uma delas, conhecida como caminho das águas, é cavar valas
no terreno dos quintais das casas para que o líquido que escorre das pias e
tanques alcance as raízes das fruteiras.
“Sempre
aproveitei a água que a gente usa em casa. Mesmo com a chegada das cisternas,
eu tenho cuidado pra não destruir a água. Porque eu já sofri com falta de água
e a água era ruim, mas criava as verduras!”, contou a agricultora Eunice
Dantas, conhecida como dona Nicinha, no boletim
O Candeeiro, um instrumento de sistematização e comunicação popular que a
ASA utiliza para contar as histórias de vida dos agricultores e agricultoras.
Com
um pouco mais de estrutura, as valas no chão são substituídas por canos e duas
caixas filtram a água antes de ser despejada nas plantas. Essa tecnologia,
conhecida como bioágua, é muito difundida no Rio Grande e Pernambuco, por
exemplo. A primeira caixa tem camadas intercaladas de brita grossa e fina com
areia que retiram os resíduos da água. E a segunda, recebe a água filtrada,
antes de gotejar nas plantas. É assim na propriedade de seu Antônio e dona
Marlene Magalhães, do Sitio Carnaubinha, em Afogados da Ingazeira, em
Pernambuco, há 6 anos.
“Antes,
a água do banho e da pia corria para o terreiro. No tempo das chuvas, criava
lodo que fazia desgosto. Hoje, essa água está molhando as plantas que tinha que
ser aguada por outra água. Se nós vamos escovar os dentes, a água termina nas
plantas. Não desperdiçamos nenhum copo de água”, conta seu Antônio. Essa água,
na verdade, é que está salvando os pés de fruta que alimentam a família. Mesmo
assim, algumas mangueiras e goiabeiras sucumbiram à pior seca do século que,
desde 2013, tem secado o açude perto da casa deles. Segundo seu Antônio, essa é
a primeira vez que ele vê o açude sem água. (ecodebate)
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