Pesquisadores
do IAG-USP destacam que Grande SP precisa controlar a emissão dos veículos a
diesel.
Os números continuam alarmantes. Mas o
fato é que, mesmo que esteja longe de ser boa, a qualidade do ar na Grande São
Paulo melhorou nos últimos 30 anos graças, principalmente, ao controle de
emissões. Foi o que constatou a revisão da qualidade do ar na megalópole de São
Paulo, publicada na revista Atmospheric Environment.
O estudo é um resumo dos resultados
alcançados no Projeto Temático Narrowing the uncertainties on aerosol and
climate changes in São Paulo State: Nuance-SPS, que recebeu apoio da FAPESP até
a sua conclusão em 2016. Esse projeto contou com a participação de vários
institutos da Universidade de São Paulo (USP) e da Companhia Ambiental do
Estado de São Paulo (CETESB).
Apesar do crescimento da frota –
aumento de 76% de 2002 a 2012, alcançando 11 milhões de veículos em 2014 –, as
concentrações de poluentes diminuíram nos últimos 10 anos, exceto para o gás
ozônio e material particulado fino, ambos relacionados a problemas de saúde e
transtornos cognitivos, principalmente em crianças e idosos.
“O resultado é visível. Mesmo com o
incremento da frota, houve uma diminuição não só no valor absoluto nas
emissões, mas também nas concentrações ambientais”, disse Maria de Fátima de
Andrade, uma das autoras do estudo, à Agência FAPESP.
Mesmo assim, o sinal ainda é amarelo:
todos os anos na Grande São Paulo mais de 10 mil mortes estão fortemente
ligadas à poluição por material particulado.
“Estamos no limite de controle de
emissão de poluentes por veículos leves. Se houver aumento da frota, e isso é o
esperado, haverá um aumento da emissão e consequente aumento da concentração
ambiental. A estratégia é diminuir a frota em circulação, ampliar o uso de
transporte coletivo e buscar combustíveis mais limpos, principalmente para os
veículos pesados, como ônibus, que usam diesel que ainda é altamente poluente e
que podem ser substituídos, por exemplo, por combustíveis mais limpos,
incluindo os elétricos ou híbridos”, disse Andrade.
A pesquisa – que contou com
pesquisadores dos Institutos de Astronomia, Geofísica e Ciências Atmosféricas,
Física, Química, Geociências e Escola de Artes, Ciências e Humanidades da USP –
verificou mudanças nas concentrações de poluentes na atmosfera da Grande São
Paulo. Nos anos 1980, havia grande concentração de óxidos de enxofre (SOx),
monóxido de carbono (CO), ozônio (O3), nitratos (NOX) e aldeídos
(RCHO). Nessa década, houve o início do controle das emissões industriais com a
utilização de combustíveis com baixo teor de enxofre, ou mudanças no
combustível de caldeiras industriais – e também a introdução do Proálcool.
Na década seguinte houve queda nas
concentrações de enxofre e aumento de hidrocarbonetos, aldeídos e material
particulado. Não por acaso, foi na década de 1990 que ocorreram medidas de
controle nas indústrias para redução de poluição por enxofre e a instituição do
rodízio veicular. Mas há ainda concentrações elevadas de
hidrocarbonetos e material particulado associadas com o aumento do consumo de combustíveis
e da frota, com boa parte dela não atingindo os limites de emissão impostos
pela legislação.
Na década de 2000, começou-se a
perceber nas medidas ambientais o efeito do controle de emissões da frota de
veículos leves em função da implantação em 1986 do Programa de Controle da
Poluição do Ar por Veículos Automotores (Proconve).
Dez anos depois, observou-se a queda
de praticamente todos os poluentes, exceto o de hidrocarbonetos e material
particulado. De acordo com Andrade, isso se deu por causa do aumento da frota e
o consequente crescimento do uso de combustível.
“Apesar do controle das emissões por exaustão
(dos escapamentos), houve um aumento das emissões por evaporação (abastecimento
e cárter), o que explica a maior concentração de hidrocarbonetos. Já a
manutenção da concentração de material particulado se deu em virtude do atraso
na implementação da fase P7 do Proconve [para controle de emissões de
partículas pelos veículos pesados] e também pelo aumento da frota”, disse.
Tipo 100% paulistano
A poluição de São Paulo tem suas
especificidades. A megalópole tem uma frota enorme e antiga. A média de idade é
de nove anos para veículos leves e 10 para caminhões. Nos Estados Unidos e na
Europa esses números são sete e oito, respectivamente. Além disso, no Brasil é
usado um combustível diferente dos outros países, com o uso de etanol e
biodiesel.
No âmbito do Projeto Temático
Nuance-SPS, pesquisadores, em um estudo recente, indicaram que os veículos
leves de São Paulo emitem 3,5 vezes mais formaldeídos e acetaldeídos que os da
Califórnia. Outra constatação foi que as concentrações de hidrocarbonetos estão
em níveis mais altos que outras megacidades do mundo – como Pequim, Londres,
Los Angeles e Paris –, apesar da redução dessas concentrações na Grande São
Paulo.
A análise das concentrações de
poluentes nos últimos 30 anos mostra também que muito mudou, tanto em
legislação como nos métodos de medida. Dessa forma ampliou-se muito o
conhecimento sobre o impacto dos poluentes na qualidade do ar em São Paulo e na
saúde da população. E não só localmente, mas mundialmente também houve muitos
avanços na área de estudo de poluição atmosférica.
“Ganhamos em conhecimento da
importância das emissões urbanas. Atualmente os inventários de emissões de poluentes
em escala global reconhecem a importância das cidades. Em estudos anteriores
era comum negligenciar emissões locais, como por exemplo, do setor de
transporte. Existem várias iniciativas mundiais para quantificar melhor a
contribuição urbana”, disse Andrade.
A pesquisadora explica que para fazer o cálculo
das estimativas de emissão de poluentes na atmosfera usava-se muito valores com
as características dos países desenvolvidos. “Nos inventários havia estimativas
para o hemisfério Norte e para o hemisfério Sul concentrava-se na questão das
queimadas de florestas”, disse.
A própria relação das
mudanças climáticas com a poluição local foi revista. “Antes existia uma
estratégia de não considerar os poluentes locais urbanos como atuantes nos
processos climáticos. Mais recentemente, a abordagem tem sido um pouco
diferente. Os poluentes emitidos localmente e que estão relacionados com
poluição do ar podem ter impacto climático também, é o caso do próprio ozônio e
algumas partículas”, disse.
Isso melhorou a modelagem da
contribuição de cidades e megacidades para a poluição atmosférica e mudanças
climáticas. E ao mesmo tempo as cidades serão as mais afetadas pelas mudanças
climáticas. Tem-se a noção de que ao mudar o clima, além de impactos como
enchentes, secas, aumento de temperatura, haverá uma mudança também nas
concentrações de poluentes na atmosfera que vai ser mais sentida nas populações
das cidades.
“Por exemplo, se houver aumento de
temperatura pode haver aumento na concentração de ozônio, se mudar umidade
também vai alterar a composição dos compostos na atmosfera”, disse Andrade.
Para a pesquisadora, isso prova que, quando se
pensa em restrição das emissões, a cidade ganha duas vezes: ganha em qualidade
do ar e contribui com a redução de impacto climático. (ecodebate)
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