Tema água precisa estar na agenda do cidadão comum, diz
diretor do 8° Fórum Mundial.
Pela 1ª vez,
o Fórum Mundial da Água ocorrerá em um país do Hemisfério Sul. O potencial hidrográfico
fez com que o Brasil fosse escolhido como sede. Para o diretor executivo do 8º
Fórum Mundial da Água, Ricardo Andrade, um dos principais objetivos é chamar a
atenção do cidadão comum.
“É fazer
com que o tema água entre na agenda do dia a dia do cidadão. Não só do cidadão
mobilizado, aquele que discute o tema da água, mas daquele cidadão comum, que
acha que a água nasce na torneira, que para ter água limpa precisa de torneira
limpa, que não tem a percepção da importância de cuidar bem da água”, destaca.
Andrade é
diretor de Gestão da Agência Nacional de Águas (ANA) e um dos 50 profissionais
responsáveis pela organização do Fórum Mundial da Água, que ocorrerá em
Brasília entre os dias 18 e 23 de março/2018.
Ele
ressalta que a realização do fórum é um desafio. “Alguns falam que teremos 30
mil participantes. Outros dizem que pode ser até mais do que isso. Mas a nossa
pretensão não é fazer o fórum com o maior número de participantes, mas um fórum
que de fato transforme a discussão política sobre a água, que eleve nossa
preocupação com o tema da água. Acho que esse poderá ser o principal legado do
Fórum.”
Veja a
seguir os principais trechos da entrevista de Ricardo Andrade à Agência
Brasil:
Agência
Brasil: O
que levou o Brasil a ser escolhido para sediar o Fórum Mundial da Água?
Ricardo
Andrade: Vamos começar pelo papel da ANA, que é uma instituição nova, com
apenas 17 anos – foi criada em 2000. Por ser uma agência nacional, que não tem
escritórios regionais, mas atua em todo o país por meio de parcerias com órgãos
estaduais, a ANA sempre buscou parcerias no exterior. A partir daí, marcamos
presença no Conselho Mundial da Água (CMA), que é o promotor do Fórum Mundial
da Água. A realização do fórum no Brasil se tornou quase que uma obrigação. E
aqui há um ponto que precisa ser bem esclarecido: é o de que isso não foi uma
iniciativa da ANA. A agência foi provocada. As diversas instituições
brasileiras ligadas à água se reuniram e entenderam que estava na hora de
realizar o fórum na América do Sul. E isso se justificava com o argumento de
que o Brasil tinha o que mostrar: a maior oferta hídrica individual do mundo.
Agência
Brasil: Como
o país está lidando com esse desafio?
Andrade: É um desafio, sem
dúvida. Alguns falam que teremos 30 mil participantes. Outros dizem que pode
ser até mais do que isso. Mas a nossa pretensão não é fazer o fórum com o maior
número de participantes, mas um fórum que de fato transforme a discussão
política sobre a água, que eleve nossa preocupação com o tema da água. Acho que
esse poderá ser o principal legado do fórum. Uma das expectativas é fazer com
que a água entre na agenda do dia a dia do cidadão. Não só do cidadão
mobilizado, aquele que discute o tema da água, mas daquele cidadão comum, que
acha que a água nasce na torneira, que para ter água limpa precisa de torneira
limpa, que não tem a percepção da importância de cuidar bem da água.
Agência Brasil: Como é essa presença brasileira no Conselho Mundial da Água?
Agência Brasil: Como é essa presença brasileira no Conselho Mundial da Água?
Andrade: Desde 2003, a ANA atua no
conselho, mas em 2009, resolvemos ampliar um pouco essa presença, porque a
agência estava mais madura e queria ter uma representatividade maior. E dada a
importância do Brasil na questão da água e a liderança que o país exerce nesse
tema, a ANA passou a liderar o processo de engajamento internacional. Hoje, o
presidente do Conselho Mundial da Água é um brasileiro, o professor Benedito
Braga, representante da Escola Politécnica da Universidade São Paulo e atual
secretário de Saneamento do estado de São Paulo. O Brasil tem ainda quatro
governadores no Conselho.
Agência
Brasil: Por
que o senhor acha que falar em maior oferta hídrica passa a impressão de a água
ser inesgotável?
Andrade: Porque dá a sensação de que
nós temos muita água, que ela nunca via acabar e que não temos que nos preocupar
com ela. E isso não é verdade. Nós temos essa água, sim. Mas onde tem água não
tem gente e onde tem gente não tem água. Na Amazônia, tem água, mas não tem
gente. No Nordeste, em quase todo o litoral brasileiro, tem gente, mas não tem
água. E onde tem água e tem gente, muitas vezes, a água não é bem cuidada. É
poluída, desperdiçada. Então, passando por essas reflexões, entendemos que era
o momento de oferecer ao Conselho Mundial da Água a oportunidade de trazer o
Fórum para o Hemisfério Sul.
Agência
Brasil: Partindo dos resultados dos fóruns anteriores, o senhor diria que houve
realmente um progresso na discussão do tema da água, desde o primeiro lá no
Marrocos?
Andrade: Um fato inédito, por
exemplo: nós temos um compromisso de desenvolvimento sustentável especifico
para a água. Dizer que isso é resultado apenas das discussões ocorridas nos
Fóruns Mundiais da Água talvez seja exagerado, mas dizer que os Fóruns Mundiais
da Água não tiveram nada a ver com isso seria leviano e falso. Então, acho que
os fóruns contribuíram sim para a discussão, mobilizaram a sociedade, e os seus
resultados são reais. Hoje, você tem dezenas de eventos sobre água em
diferentes regiões do mundo a cada ano. Sempre mobilizando as populações
locais, a sociedade, os governantes.
Agência
Brasil: Como
esses eventos podem, de algum modo, trazer soluções?
Andrade: Não
se consegue oferecer água de boa qualidade no tempo certo e no lugar correto se
não tiver financiamento, se não tiver uma boa governança. Não adianta oferecer
água se não tratar o esgoto, porque aí o manancial que se tinha para oferecer
água perde a qualidade. E aí passa a se ter um problema de quantidade não
porque falta água, mas porque falta qualidade. Então, o grande desafio, de
fato, está nessa linha. Os investimentos do governo avançaram, a
conscientização da população avançou. Estamos avançando, temos ainda muito a
progredir, mas organizações como a ANA, as agências reguladoras estaduais, as
companhias de saneamento, os governos, no Brasil em especial, têm trabalhado incansavelmente
para melhorar os índices de qualidade de vida.
Agência
Brasil: O
senhor acredita que o Fórum Mundial da Água no Brasil vai ampliar essa
compreensão do tema?
Andrade: Há um dado
interessante que eu poderia citar a partir das reuniões preparatórias do fórum
que tivemos em Brasília. Uma ocorreu em junho de 2016, antes da crise hídrica,
e outra em Abril de 2017, durante a crise por que passa a capital. Na primeira reunião,
30% do público eram de moradores locais. Na segunda, esse público local era de
60%. Qual a diferença entre as duas reuniões? Em 2016, tínhamos normalidade no
abastecimento de água e, em 2017, tínhamos uma situação de crise instalada. Os
sinais são muito claros de que o fato de a crise estar instalada aumentou o
interesse pelo tema água. Então, é possível que o fato de se correr o risco de
não ter págua em casa leve as pessoas a refletir sobre a água disponível, a
necessidade de economizá-la, de usar essa água racionalmente, de protegê-la de
certa forma, de cobrar os governantes, e não apenas os governantes, mas o
cidadão, seu próprio vizinho. (ecodebate)
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