Construções às margens da
Represa Billings, um dos principais reservatórios de água da região
metropolitana de São Paulo/SP.
A expansão urbana desordenada ou
a ocupação inadequada de áreas da cidade geram “um somatório de problemas”, que
se estendem desde a falta de moradia digna até a proliferação de doenças e
o agravamento da crise ambiental. Como lembra o professor Pedro Roberto Jacobi,
que pesquisa a “governança global da
macrometrópole paulista face às mudanças climáticas” e
coordena o projeto temático FAPESP (2018-2022), intitulado “Governança
Ambiental da Macrometrópole Paulista face às Mudanças Climáticas”
(MacroAmb), “essa não é uma história nova” no Brasil. “É uma história
que se repete: na medida em que a gestão
pública não dá conta de uma
demanda por moradia, de uma população que não tem recursos para entrar no
mercado imobiliário, desencadeia uma expansão urbana desordenada”. Entretanto,
alerta, “a ocupação das áreas próximas aos reservatórios tem reduzido o
potencial de produção de água, eliminando mata ciliar. A perda de mata ciliar é
um fenômeno que aumenta a erosão, de um lado. De outro lado, existe o problema
da falta de saneamento nas áreas de ocupação irregular, que contamina
as águas, provocando sua eutrofização e, com isso, reduzindo o potencial de
aproveitamentos desses reservatórios”.
Na entrevista a seguir,
concedida por telefone à IHU On-Line, Jacobi frisa que, no atual contexto de escassez hídrica,
“coloca-se a necessidade de se controlar a ocupação desordenada de áreas que
são absolutamente fundamentais para garantir água”. Aqueles que moram em
residências adequadas, explica, “têm muito mais segurança hídrica por
conta das caixas d’água, mas as pessoas com baixa renda não têm essa capacidade
econômica de garantir um reservatório melhor; além disso, armazenam água de
forma inadequada e, com esse armazenamento incorreto, potencializam
a disseminação de dengue, por exemplo, e outros vetores de insetos e
roedores”.
A resolução da expansão urbana desordenada e
da construção de moradias
irregulares, pontua, demanda
respostas complexas e um alto custo político. “Há várias iniciativas que
tentaram amenizar o problema, isto é, urbanizar essas áreas. É difícil
generalizar, porque penso que há locais que o poder público não poderia deixar
ocupar. Uma vez ocupado, a grande questão é saber se a desocupação vai ter um
elevado custo político para o gestor ou se ele irá enfrentar o problema. Em
muitos casos o que se observa é uma relação de promiscuidade mesmo, de que não
se enfrenta o problema por causa do custo político, porque isso poderia impedir
a reeleição”.
Pedro Roberto Jacobi é
graduado em Ciências Sociais e em Economia pela Universidade de São Paulo –
USP, mestre em Planejamento Urbano e Regional pela Graduate School of Design –
Harvard University e doutor em Sociologia pela USP. É professor titular sênior
do Programa de Pós-Graduação em Ciência Ambiental da USP, editor da
revista Ambiente e Sociedade, presidente do Conselho do ICLEI- Governos Locais
pela Sustentabilidade – América do Sul, membro da Divisão Científica de Gestão,
Ciência e Tecnologia Ambiental do Instituto de Energia e Ambiente – USP,
coordenador do Grupo de Acompanhamento e Estudos de Governança Ambiental –
GovAmb/IEE, membro do Conselho e Pesquisador do Núcleo de Pesquisa
Interdisciplinary Climate Investigation Center – Incline, da USP, coordenador
do grupo de Estudos de Meio Ambiente e Sociedade do Instituto de Estudos
Avançados da USP, pesquisador Colaborador do IEA/USP junto ao Programa USP
Cidades Globais. Membro do Conselho Estratégico do Programa USP Cidades Globais
do Instituto de Estudos Avançados da USP.
Confira a entrevista.
IHU On-Line – Como
foi feito o estudo da FAPESP, o qual mostra que a expansão urbana
desordenada da população de baixa renda se estende para áreas de preservação
ambiental?
Pedro Roberto Jacobi
– A divulgação dessa
atividade estava vinculada ao Fórum MacroAmb, a partir da fala de uma professora da Universidade Mackenzie. É
importante separar as atividades do Fórum com as atividades de pesquisa que eu
coordeno.
IHU On-Line – A
pesquisa da Fapesp faz parte da pesquisa que o senhor coordena?
Pedro Roberto Jacobi
– A pesquisa que coordeno
se denomina “Governança global da
macrometropole paulista face às mudanças climáticas”, então é um projeto de cinco anos, que agrega um
conjunto de temas, como o da governança, o tema do território, do clima, dos
serviços ecossistêmicos e da energia. Dentro dessas atividades do projeto,
temos uma preocupação em ampliar o debate sobre as problemáticas da macrometrópole.
Esse tema da ocupação das áreas de
mananciais não é novo; pode-se levá-lo para meados da década de 1970,
quando foi definida a primeira legislação sobre mananciais da região
metropolitana de São Paulo. A revisão da legislação ocorreu em 1997.
Então, é uma história que se arrasta há muito tempo e está associada
ao déficit de moradia, mas também à falta de monitoramento das autoridades
públicas em torno dessa ocupação. O problema tem se agravado, cada vez mais, em
virtude de uma questão que se coloca como nova na região metropolitana:
a escassez hídrica. O que se observa é que, efetivamente, a escassez
hídrica é o cenário que tem que ser definido cada vez mais como condicionante
da realidade e da disponibilidade de água na região
metropolitana de São Paulo, cuja tendência é ter cada vez menos
disponibilidade em virtude de alguns problemas que não têm sido bem resolvidos,
como a contaminação das águas e a dificuldade de aproveitamento de diversos
rios da região.
Região Metropolitana de São
Paulo.
IHU On-Line –
Considerando o risco de abastecimento de água, como essas pesquisas têm servido
de subsídio para o poder público enfrentar tanto a questão da crise hídrica
quanto da moradia?
Pedro Roberto Jacobi – Eu diria que a gestão
pública tem sido omissa
e pouco atenta à questão. A novidade é que o município de São
Paulo aprovou a lei de segurança hídrica: essa é uma novidade aprovada pelo prefeito na
semana passada, mas ainda precisa ser regulamentada. Trata-se de um avanço
importante no município de São Paulo, mas não abrange a região metropolitana
nem a macrometrópole. Quando estamos falando da macrometrópole,
falamos de um território de 174 municípios vinculados a diversas bacias
hidrográficas do estado de São Paulo. Quando falamos da região metropolitana,
estamos falando apenas da bacia do Alto Tietê. Quando incluímos macrometrópole, incluímos
várias bacias que são interligadas e alimentam, de fato, a região
metropolitana, que é um grande sorvedouro de água com seus mais de 22 milhões
de habitantes, enquanto a macrometrópole comporta 35 milhões de pessoas e
abrange outras bacias importantes, inclusive bacias com as quais a região
metropolitana de São Paulo divide a outorga, que é a bacia
do Piracicaba, Capivari e Jundiaí. Cabe destacar a importância dos comitês de
bacias hidrográficas da Macrometropole como fóruns muito relevantes, na medida
em que, além dos segmentos, governo e municípios participam representantes de
diversos segmentos da sociedade civil como atores estratégicos para a governança
democrática da água.
As partes coloridas do mapa
mostram a Macrometrópole Paulista. Saiba mais aqui.
IHU On-Line – Qual é a novidade desta nova lei? O
que ela determina?
Pedro Roberto Jacobi – Esta lei está determinando
uma necessidade de um acompanhamento mais sistemático dos processos de mudanças
climáticas. Ainda não tenho toda a informação sobre a lei de segurança hídrica,
mas a questão central é trazer as mudanças climáticas como condicionantes das
decisões políticas. Essa legislação é uma atualização do Plano Municipal de
Saneamento Básico, que garante à população o acesso à quantidade adequada de
água de boa qualidade por meio da integração de políticas de saneamento, meio
ambiente, gestão de recursos hídricos e uso do solo. Aqui está se colocando uma
questão que precisa acontecer: uma política composta de planos, programas e
projetos relacionados à gestão de recursos hídricos no território da cidade de
São Paulo.
Ainda há uma etapa em que serão definidos os
princípios dessa segurança hídrica, mas, fundamentalmente, se propõe a
revitalização e proteção dos corpos de água, incentivos de água pluviais para
fins não potáveis, reforço do sistema de alerta para prevenir a população sobre
desastres relacionados à água. Esses aparecem como destaques da política
municipal de segurança hídrica. A adaptação às mudanças climáticas é um dos
focos da política. Basicamente ainda é uma declaração de intenções, mas, pelo
menos, introduz-se a palavra “segurança hídrica” no plano de saneamento básico
e nas políticas do município.
É importante destacar o fato de que a prefeitura de
São Paulo assume a palavra “segurança hídrica” como um termo necessário para
discutir a governança da água – Pedro Roberto Jacobi
O que de fato acontece é que a maior parte dos
municípios é administrada pela Companhia de Saneamento Básico do Estado de São
Paulo – Sabesp. Mas é importante destacar o fato de que a prefeitura de São
Paulo assume a palavra “segurança hídrica” como um termo necessário para
discutir a governança da água, de um lado. De outro lado, essa proposta decorre
de um movimento social, principalmente de um trabalho exercido pela Aliança
pela Água, articulado por grupos não governamentais durante o período da
escassez hídrica de 2014/2015. Foi por meio da insistência da articulação da
Aliança pela Água que esse tema entrou na Câmara Municipal e os legisladores
incorporaram essa premissa. É uma novidade para uma cidade do porte de São
Paulo, com 11 milhões de habitantes.
IHU On-Line – Qual é a correlação entre a expansão
urbana desordenada em áreas de preservação ambiental e o risco de abastecimento
de água? Como essa expansão pode causar risco de abastecimento e de escassez
hídrica? O que se tem observado na macrometrópole de São Paulo a esse respeito?
Pedro Roberto Jacobi – É importante destacar que
essa não é uma história nova: a ocupação das áreas próximas aos reservatórios
tem reduzido o potencial de produção de água, eliminando mata ciliar. A perda
de mata ciliar é um fenômeno que aumenta a erosão, de um lado. De outro lado,
existe o problema da falta de saneamento nas áreas de ocupação irregular, que
contamina as águas, provocando sua eutrofização e, com isso, reduzindo o
potencial de aproveitamento desses reservatórios. Em São Paulo há
reservatórios, como é o caso do Billings, em que parte da água não pode ser
aproveitada para consumo em virtude da existência de metais pesados que se
acumularam lá por muito tempo.
A história se repete sem que as autoridades consigam
institucionalmente eliminar o problema existente – Pedro Roberto Jacobi
Essa é uma história que se repete: na medida em que
a gestão pública não dá conta de uma demanda por moradia, de uma população que
não tem recursos para entrar no mercado imobiliário, desencadeia uma expansão
urbana desordenada. A história da urbanização brasileira é uma história de duas
cidades: uma formal e outra pouco organizada. Cada realidade tem que ser olhada
por seu lado específico, mas há pessoas que em nome de um capital político
populista incentivam as pessoas a essas ocupações, mas depois tem o problema da
contaminação dos recursos de água. Isso acontece não apenas em São Paulo, mas
em muitas cidades brasileiras, onde a população se organiza próximo a
reservatórios, a rios que são contaminados.
Quando olhamos para casos internacionais, observamos
que existe uma preocupação em proteger essas fontes de água, e quando a
população está morando sobre a água ou muito próximo a regiões de rios, o
potencial de contaminação é elevado. Tudo isso está relacionado a problemas que
se associam ao planejamento urbano mais regularizado, definido de forma a
garantir serviços, acessos, reduzindo o potencial de contaminação das águas. A
história se repete sem que as autoridades consigam institucionalmente eliminar
o problema existente.
IHU On-Line – Quais são as demais implicações
ambientais da expansão urbana em áreas de preservação ambiental?
Pedro Roberto Jacobi – Talvez o problema maior das
nossas cidades seja a questão da mobilidade urbana. Na medida em que há um
atraso e um investimento na cidade muito mais vinculado ao uso do automóvel do
que do transporte público, temos um passivo na cidade associado à mobilidade
urbana. Isso afeta enormemente a vida dos cidadãos. Além disso, o transporte
não é controlado do ponto de vista dos contaminantes, e isso aumenta as emissões
de CO2, o que gera um impacto direto na vida das pessoas. A cidade
precisa ser vista como um metabolismo: as veias ficam cada vez mais entupidas
e, quando se tem veias entupidas, o risco é o colapso.
A cidade precisa ser vista como um metabolismo: as
veias ficam cada vez mais entupidas e, quando se tem veias entupidas, o risco é
o colapso – Pedro Roberto Jacobi
Há um passivo não resolvido de deslocamento das
pessoas na grande cidade: São Paulo tem mais ou menos 100 quilômetros de metrô.
Se compararmos com a Cidade do México, que tem mais ou menos a mesma população,
lá tem mais de 300 quilômetros de metrô. Nosso sistema de metrô está muito
atrasado em relação à expansão urbana que aconteceu para outras partes das
cidades. O tempo para que isso efetivamente possa reduzir o passivo é muito
grande, porque a articulação entre o sistema metroferroviário é muito precária.
Há muitas cidades que estão investindo em metrôs de superfície e vias
exclusivas de ônibus, mas, dada a falta de monitoramento, não há controle da
poluição.
Um terceiro tema é a biodiversidade urbana, que é
muito preocupante, porque se eliminam áreas verdes por conta da expansão da
especulação imobiliária. Há ainda o tema dos resíduos sólidos, cuja coleta é
muitas vezes insuficiente nas áreas periféricas. Vale destacar que hoje eventos
climáticos extremos fazem parte do conjunto de problemas que, sem dúvida,
afetam muito mais as populações mais vulneráveis.
IHU On-Line – A expansão urbana desordenada tem
crescido mais significativamente na macrometrópole paulista ou há expansão
desordenada em outras regiões de São Paulo?
Pedro Roberto Jacobi – A macrometrópole ocupa
diversas regiões metropolitanas – como a de Campinas e Santos –, então cada
região metropolitana tem suas características e seus problemas. À medida que as
cidades aumentam seus tamanhos e suas populações, a depender da insuficiência
da provisão de habitação, aumenta o número de pessoas em situação mais
precarizada. É difícil generalizar isso, mas é preciso observar que todas as regiões
metropolitanas ainda têm um número elevado de pessoas vivendo em condições de
vulnerabilidade em diferentes tipos de realidade. Cidades como Porto Alegre,
Curitiba, Salvador, Recife, têm suas periferias mal resolvidas.
Na própria região amazônica, Manaus é uma cidade com
elevadíssimos problemas de vulnerabilidade urbana, associadas a uma lógica de
ocupação fundiária com palafitas, pela precariedade de política habitacional,
mas acima de tudo de algo que obviamente, em um período de maior crise econômica
do país, se reflete nas condições de vida da população. Como atualmente estamos
há alguns anos em uma situação na qual um percentual da população tem uma
condição altamente precarizada no mundo do trabalho, isso se acentua. Uma coisa
não está desvinculada da outra. Sem dúvida, na medida em que há poucos
investimentos, o poder público não responde com eficiência. Mesmo programas
como o Minha Casa Minha Vida, que foi importante, chegou um momento em que
destinava mais recursos a uma população com mais renda do que àquela
originalmente prevista.
Mesmo programas como o Minha Casa Minha Vida, que
foi importante, chegou um momento em que destinava mais recursos a uma
população com mais renda do que àquela originalmente prevista – Pedro Roberto
Jacobi
IHU On-Line – Socialmente, como o senhor analisa o
fenômeno da expansão urbana desordenada? Que tipo de política seria mais
adequada para resolvê-lo? Seria mais adequado retirar as pessoas dessas áreas
ou urbanizar as áreas para que as pessoas possam morar nesses lugares?
Pedro Roberto Jacobi – Há várias iniciativas que
tentaram amenizar o problema, isto é, urbanizar essas áreas. É difícil
generalizar, porque penso que há locais que o poder público não poderia deixar
ocupar. Uma vez ocupado, a grande questão é saber se a desocupação vai ter um
elevado custo político para o gestor ou se ele irá enfrentar o problema. Em
muitos casos o que se observa é uma relação de promiscuidade mesmo, de que não
se enfrenta o problema por causa do custo político, porque isso poderia impedir
a reeleição.
Hoje, em um contexto de escassez hídrica, que é uma
palavra nova para a gestão, coloca-se a necessidade de se controlar a ocupação
desordenada de áreas que são absolutamente fundamentais para garantir água. Em
Nova Iorque há áreas bastante distantes da cidade que são protegidas para
garantir que, efetivamente, em virtude do potencial efeito das mudanças
climáticas, as pessoas tenham acesso à água de forma mais equânime. O que
observamos, na medida em que já há um elevado número de pessoas morando em
cidades verticalizadas, é que essas pessoas têm muito mais segurança hídrica
por conta das caixas d’água, mas as pessoas com baixa renda não têm essa
capacidade econômica de garantir um reservatório melhor; além disso, armazenam
água de forma inadequada e, com esse armazenamento incorreto, potencializam a
disseminação de dengue, por exemplo, e outros vetores de insetos e roedores. Há
um somatório de problemas que se acentuam nas áreas de ocupação irregular. A
resposta é complexa, mas, sem dúvida, em muitos casos, haverá a necessidade de
remoção, que tem um custo político.
Há um somatório de problemas que se acentuam nas
áreas de ocupação irregular – Pedro Roberto Jacobi
IHU On-Line – É possível estimar que percentual de
áreas de preservação ambiental em São Paulo já foram ocupadas por conta da
expansão urbana desordenada?
Pedro Roberto Jacobi – Essa é uma conta complicada.
O que se pode falar é que, de uma maneira ou de outra, há milhões de pessoas
morando em áreas não regularizadas. Agora, considerar que essas são áreas que
precisam ser desocupadas é outra questão. As estatísticas estão um pouco
defasadas. Inclusive, o último Censo é de 2010 e não sabemos como serão os
dados de 2020, com todas essas mudanças. Tenho certa insegurança em falar em
percentuais, mas é um número significativo de pessoas que moram em condições de
precariedade e de vulnerabilidade.
IHU On-Line – Que tipo de governança ambiental é
desejável e possível para lidar com a expansão urbana desordenada e mitigar
problemas ambientais?
Pedro Roberto Jacobi – A grande questão é justamente
a lógica de uma gestão tão atomizada. Apesar de estarmos falando de uma região
metropolitana, não existe de fato uma gestão articulada dos 39 municípios.
Diria que nós temos pelo menos cinco aspectos a considerar:
1) do ponto de vista da água, garantir um preço
justo para que a população possa pagar;
2) completar o sistema de saneamento básico, que
ainda está muito incompleto na região metropolitana de São Paulo
principalmente, porque isso afeta diretamente o ciclo hídrico em toda a região
macrometropolitana, por conta do rio Tietê;
3) reduzir ao máximo o desmatamento, porque esse
desmatamento provoca a perda de mata ciliar e da proteção das fontes hídricas;
4) do lado das emissões, obviamente, precisa
controlar o uso do automóvel e aumentar o potencial de mobilidade urbana
coletiva, que ainda é extremamente precarizado;
5) do ponto de vista do resíduo sólido, é preciso
implementar políticas mais articuladas que promovam, em maior escala, a coleta
seletiva e o estímulo à reciclagem. Trata-se de iniciativas de tentar reduzir o
uso de áreas para despejo de resíduos sólidos. Isso já está ocorrendo em várias
partes do mundo.
A resolução dessas questões depende das políticas
públicas, porque temos um atraso enorme – em 2014 havia a previsão para ter
acabado com os lixões no país e isso está sendo discutido, novamente, no
Congresso. Isso demonstra a incapacidade dos municípios de fazerem sua parte ou
de se juntarem, por meio de consórcios, para atenuar tais impactos e a
destruição do meio ambiente.
IHU On-Line – Como o senhor avalia a iniciativa do
jornal The Guardian de mudar a terminologia “mudança climática” para “crise
climática”, “emergência climática” ou “colapso climático”, com a justificativa
de que esses termos expressam o fenômeno de forma mais adequada? A nova
terminologia é mais adequada?
Pedro Roberto Jacobi – Trata-se de uma terminologia
que estimula uma visão mais catastrofista. Por outro lado, existe sempre um
contraditório entre as visões do Norte e a dificuldade de trazer à compreensão
determinados temas nos países do Sul. Uma jovem líder como a Greta Thunberg é
do Norte e traz uma preocupação do Norte, que visa mobilizar o Sul. Mas se
observarmos as preocupações do Sul em comparação com as do Norte, quando das
manifestações ocorridas em abril, observamos que os sistemas têm um grau de
intangibilidade muito significativo.
Produzi uma publicação cujo título é Melhor
prevenir: olhares e saberes para a redução de risco de desastre, que é uma
publicação para escolas para mostrar a alunos do Ensino Médio, buscando uma
mobilização das pessoas em torno do tema. É um grande complicador para chegar
aos corações e mentes da sociedade, para entender um problema que não pode ser
apresentado apenas de uma forma catastrofista.
Se usa a palavra emergência climática, o The
Guardian tem razão para fazê-lo. Do nosso ponto de vista, de um grupo seleto de
pessoas preocupadas com o clima, tudo bem fazer isso, mas para a grande maioria
da população, não é assim que as coisas aparecem. As pessoas só se dão conta
dos problemas quando acontecem os eventos climáticos extremos. Tem um gap que
não é fácil de preencher. Podemos ficar falando que estamos no Antropoceno, mas
para a maioria da população isso diz pouco. Só nos damos conta dos problemas
graves quando eles acontecem: a questão dos deslizamentos só recebe atenção
quando chove muito, mas quando não chove, nada acontece. Não há uma resposta
simples para dar; a questão é como transmitir isso à população.
Só nos damos conta dos problemas graves quando eles
acontecem: a questão dos deslizamentos só recebe atenção quando chove muito,
mas quando não chove, nada acontece – Pedro Roberto Jacobi.
Eu mesmo faço parte de uma rede latino-americana de
mudanças climáticas e processos decisórios, apoiada pela Unesco, com
integrantes de cinco países da América do Sul e Costa Rica, para tentar chegar,
através do nosso trabalho de pesquisa e do conhecimento acumulado, junto aos
governos locais. É um trabalho de formiga. Não podemos desistir dessa tarefa,
independente dos gestores de plantão no Brasil, que na área ambiental estão
propondo muito mais desmontar do que se vincular a uma agenda que está sendo
assumida globalmente.
A palavra usada pelo The Guardian não é inadequada,
mas é muito difícil de fazer com que essa capilaridade seja assumida pelos
países do Sul e também pelos países do Norte. Basta olhar para os Estados
Unidos, que, com um governante como Trump, jamais utilizará a expressão
“emergência climática”. Nem por isso nós temos que deixar de lado essa questão,
ou seja, a Encíclica do Papa que vocês sempre divulgam, de certa forma, fala
que estamos vivendo uma situação que exige cada vez mais uma atenção e uma
lógica de prevenção, que é aquilo que acredito ser o mais importante: alertar
sem tornar isso uma imagem de catástrofe que deixe as pessoas imobilizadas.
Esse é o caminho que temos dentro da universidade, das ONGs. São gotas no
oceano. Por isso a gestão pública é importante, promover uma lei de segurança
hídrica é importante.
IHU On-Line – Deseja acrescentar algo?
Pedro Roberto Jacobi – É preciso mobilizar para que
as pessoas estejam comprometidas com as políticas públicas, fazer com que elas
se sintam responsáveis com a questão dos resíduos, da água, da biodiversidade,
do ar que respiram e fazer com que elas acreditem que a destinação inadequada
dos resíduos, por exemplo, estimula que os problemas se multipliquem. Na medida
em que cada um faz sua parte e a gestão pública faz sua parte, teremos
condições mais favoráveis. A temática ambiental perpassa tudo e os ODSs
[Objetivos de Desenvolvimento Sustentável] mostram isso e são um caminho
importante para pensarmos os nossos desafios. É preciso interesse e motivação
da gestão pública e não somente uma visão puramente pragmática de cumprir
tabela.
Território ocupado por população vivendo em
condições precárias nos municípios da região tem se estendido em direção a
áreas de mananciais e de preservação ambiental, apontam pesquisadores (Comunidade
Cantinho do Céu, às margens da Represa Billings, zona sul da cidade de São
Paulo/SP) (ecodebate)
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