quarta-feira, 1 de outubro de 2025

Combustível ‘verde’ fornecido aos EUA vem de áreas de desmatamento ilegal na Amazônia

Combustível ‘verde’ fornecido aos EUA utiliza matéria-prima de áreas de desmatamento ilegal na Amazônia.

A DGD (Diamond Green Diesel), líder norte-americana na produção de diesel feito a partir de fontes renováveis, importa sebo bovino de um fornecedor abastecido por indústrias de abate brasileiras, que compraram de fazendas autuadas por desmatamento ilegal.
Corte legal ou desmatamento zero?

Uma refinaria do Texas que fornece combustível “verde” para companhias aéreas dos Estados Unidos tem comprado gordura animal de gado criado em terras desmatadas ilegalmente na floresta amazônica, de acordo com uma análise da Reuters de dados de rastreamento de gado, entrevistas e relatos de testemunhas oculares.

Sediada na Louisiana, a Diamond Green Diesel, uma joint venture entre a produtora de biocombustíveis Darling Ingredients e a empresa de refino de petróleo Valero Energy, investiu centenas de milhões de dólares em uma refinaria em Port Arthur, no Texas, que transforma gordura bovina — chamada sebo — em uma alternativa mais limpa ao combustível de aviação e ao diesel à base de petróleo.

A Diamond Green Diesel é uma empresa importante no mercado de combustíveis sustentáveis dos EUA. De acordo com documentos, a empresa arrecadou mais de US$3 bilhões em créditos fiscais nos EUA para a produção de biocombustíveis desde 2022.

Mas entrevistas e documentos mostram que pelo menos 2 empresas brasileiras que forneceram à Diamond Green Diesel dezenas de milhares de toneladas de gordura bovina desde 2023 estão comprando parte dela de frigoríficos que compraram animais de fazendas desmatadas ilegalmente na floresta amazônica.

Empresas aéreas como a JetBlue e a Southwest Airlines, que fecharam acordos com a Valero para usar o combustível de aviação “verde”, podem reivindicar o crédito pela redução de suas emissões porque a planta da Diamond Green Diesel é certificada por um acordo da Organização das Nações Unidas (ONU) para reduzir o impacto da aviação no clima, chamado Corsia.

O mercado global de combustível de aviação sustentável é pequeno, estimado em cerca de US$2,9 bilhões em 2025, segundo a empresa de análise SkyQuest Technology Group, em comparação com o mercado global de US$239 bilhões para combustível de aviação convencional. Mas espera-se que os incentivos governamentais ajudem o mercado a crescer exponencialmente, injetando mais recursos na indústria pecuária brasileira, a principal responsável pela destruição da floresta amazônica.

Pedro Piris-Cabezas, economista da organização sem fins lucrativos Environmental Defense Fund, disse que qualquer demanda adicional “poderia resultar na expansão dos rebanhos e impulsionar direta ou indiretamente o desmatamento e a degradação florestal”.

Também poderia violar a legislação brasileira. “Empresas que têm lucro com matérias-primas oriundas de uma cadeia produtiva que passa por ilegalidades, desmatamento, elas se responsabilizam também por essas ilegalidades”, disse Ricardo Negrini, procurador do Ministério Público Federal (MPF) que abriu diversas investigações governamentais sobre a indústria pecuária.

Diamond Green Diesel, Darling Ingredients, Valero Energy, Southwest e JetBlue não responderam a vários pedidos de comentários, incluindo perguntas detalhadas sobre a cadeia de fornecimento brasileira de sebo.

Para rastrear o comércio de sebo de fazendas desmatadas ilegalmente na Amazônia para a Diamond Green Diesel, a Reuters fez uma parceria com o veículo investigativo sem fins lucrativos Repórter Brasil, que ajudou a analisar documentos judiciais que vinculam frigoríficos às plantas de sebo, registros corporativos, dados comerciais e registros governamentais de rastreamento de gado.

A Reuters também entrevistou mais de uma dúzia de pessoas envolvidas em cada etapa da cadeia de fornecimento de sebo bovino, incluindo comerciantes, motoristas de caminhão, promotores, auditores e reguladores.

A Diamond Green Diesel obtém sebo de vários países, e a Reuters não conseguiu determinar quanto dele veio de fazendas em terras desmatadas ilegalmente na Amazônia.

Gado Contaminado

Em 2022, o CEO da Darling Ingredients, Randall Stuewe, anunciou a aquisição, por cerca de R$2,8 bilhões, de diversas plantas no Brasil, incluindo quatro na região amazônica, que forneceriam “gorduras residuais para serem usadas na produção de diesel renovável e combustível de aviação sustentável”, de acordo com um comunicado emitido na época.

A Reuters descobriu que uma dessas unidades de processamento no Estado do Pará, chamada Araguaia, obtinha gordura bovina de pelo menos 5 frigoríficos que não passaram em uma auditoria realizada em maio de 2025 pelo Ministério Público Federal, por abater 20.000 cabeças de gado de áreas desmatadas ilegalmente.

Em 2023, a Araguaia exportou US$4,4 milhões em sebo bovino da Amazônia para a Diamond Green Diesel, de acordo com dados comerciais da Import Genius.

Em junho, um jornalista da Reuters viu um caminhão com o logotipo da Araguaia dentro do frigorífico São Francisco, que não passou em uma auditoria por comprar gado de fazendas em terras desmatadas ilegalmente.

O motorista do caminhão, que falou sob condição de anonimato, disse à Reuters que vinha recolhendo carcaças no frigorífico São Francisco e as entregando à unidade da Araguaia há dois anos. Dois outros caminhoneiros e 2 funcionários do São Francisco confirmaram que o frigorífico era fornecedor do Araguaia.

A São Francisco não confirmou nem negou ser fornecedora da usina do Araguaia. A empresa afirmou que coopera com o Ministério Público Federal desde 2018 e que contratou uma empresa externa para monitorar sua cadeia de suprimentos.

A São Francisco obtém parte de seu gado indiretamente do Vale do Paraíso, uma fazenda que estava impedida de pastorear gado desde 2006 devido ao corte ilegal de cerca de 40 quilômetros quadrados de árvores, segundo o Ibama. Dados de rastreamento do gado mostram que o gado foi transferido do Vale do Paraíso para uma fazenda com registro limpo antes de chegar ao frigorífico.

O Ibama desbloqueou a Vale do Paraíso no ano passado porque um tribunal determinou que o prazo de prescrição havia expirado, mas seu proprietário, Antonio Lucena Barros, ainda deve cerca de R$19 milhões em multas pelo desmatamento na região, de acordo com documentos do governo.

O advogado de Barros, Calebe Rocha, afirmou em nota que seu cliente está contestando as multas na Justiça e obteve uma liminar que suspende o pagamento da multa. Ele também afirmou que não houve venda de animais na parte do Vale do Paraíso que o Ibama havia bloqueado devido ao desmatamento.

Outra planta de propriedade da Darling Ingredients obteve gordura de um matadouro que confirmou à Reuters ter comprado centenas de cabeças de gado em 2022 e 2023 do fazendeiro Bruno Heller, que a Polícia Federal descreveu como possivelmente o maior desmatador da Amazônia em uma investigação de 2023.

Em nota, o advogado de Heller, Vinicius Segatto, disse que a legislação ambiental brasileira é “excessivamente rigorosa” e que o processo criminal contra seu cliente está em andamento.
Gordura para combustível

As companhias aéreas estão sob pressão para comprar mais combustível de aviação verde, que atualmente ainda é produzido em pequenas quantidades, para atingir as metas do setor de emissões líquidas zero até 2050.

Os defensores do uso do sebo como biocombustível afirmam que a demanda por ele por si só dificilmente levará os fazendeiros a desmatar a floresta tropical para cultivar suas pastagens devido ao seu valor econômico — menos de 3% do que os matadouros recebem por cada animal.

As importações da Diamond do Brasil foram certificadas como sustentáveis pela ISCC, uma certificadora internacional que aprovou a fábrica da Diamond para o Corsia.

Para ser elegível, a biomassa usada como combustível não pode vir de terras desmatadas depois de 2008 ou de áreas protegidas, mas o ISCC disse à Reuters que não investigou a cadeia de suprimentos da Diamond porque considera o sebo um “subproduto” da indústria de carne bovina sob o Corsia.

Três especialistas que ajudaram a projetar o Corsia disseram à Reuters que o programa permite que os produtores omitam a pontuação para emissões de carbono e desmatamento da floresta amazônica porque presume que a demanda por sebo dificilmente levará os pecuaristas a aumentar seus rebanhos.

A organização da aviação civil internacional, Icao na sigla em inglês, se recusou a comentar quando questionada se considerava o desmatamento na cadeia de fornecimento de sebo uma violação de seus padrões de sustentabilidade.

No entanto, a agência disse que está “monitorando constantemente a conformidade” de terceiros responsáveis pela certificação de produtores de combustível de aviação sustentável e agradece informações sobre “quaisquer desvios potenciais” para avaliação posterior. (biodieselbr)

Por que as negociações contra poluição plástica continuam fracassando?

Negociações para tratado contra poluição por plásticos fracassam mais uma vez.

Após 11 dias de negociações, Impasse sobre limitar produção de plástico impediu assinatura do primeiro acordo global contra a crise de poluição.
A luta contra a poluição plástica não fracassa por falta de solução, mas por falta de decisão

Quando as conversas internacionais sobre poluição plástica voltam a patinar, a mensagem ao mundo é desalentadora: sabemos o que funciona, mas adiamos o que precisa ser feito. Há consenso sobre como e o que fazer, mas falta definir metas e regras com consequências reais para atingir o objetivo.

De um lado, não há quem conteste ampliar a coleta seletiva, estruturar a logística reversa, padronizar materiais e priorizar embalagens efetivamente recicláveis são pilares da solução. Também já não há dúvida de que design importa: menos multicamadas e aditivos problemáticos, cores e rótulos que não prejudiquem a triagem, e padronização que permita ganho de escala. Isso é “o que” fazer.

No entanto, persiste a divergência sobre o “quanto” produzir. Hesitamos em controlar ou reduzir a produção de matéria-prima plástica. É compreensível porque há interesses econômicos, impacto social e assimetrias entre países, mas não pode servir de pretexto para paralisar o que já está acordado. É possível avançar com metas robustas de gestão e circularidade enquanto se debate, em trilho próprio, instrumentos sobre oferta de resina virgem.
Tratado global contra o plástico: sem acordo em Genebra

Após dias de negociações intensas, representantes de 185 países encerraram o INC 5.2 sem ter consenso sobre um tratado para combater a poluição plástica.

O impasse atual revela algo incômodo: a falta de interesse em alcançar um acordo minimamente vinculante.

Se há pontos aceitos por todos, por que não os consolidar já em obrigações executórias, com prazos, métricas e mecanismos de transparência? Deixemos as divergências relevantes, tais como o controle de produção e as metas de redução absoluta para rodadas subsequentes, com metodologias e cenários bem definidos. A sociedade não pode ficar refém do “tudo ou nada”.

Enquanto isso, o mundo pisa no freio com compromissos assumidos nos últimos anos. Metas de conteúdo reciclado são relativizadas, cronogramas escorregam, cláusulas “sujeitas a condições de mercado” viram álibi para a inação. A oscilação do petróleo e a queda do preço da resina virgem corroem a competitividade do reciclado e testam a convicção das marcas. O resultado é um ciclo vicioso: a menor demanda por matéria-prima reciclada inviabiliza investimentos, que por sua vez, reduzem oferta e qualidade.

Após o fracasso das negociações da ONU em Genebra para um Tratado Global, representantes da campanha Pare o Tsunami de Plástico estão em Brasília entregando às autoridades um Manifesto que exige compromisso real do Congresso e do governo federal com a saúde das pessoas e do planeta, cobrando uma ação urgente contra a crise da poluição causada pelos plásticos.

No caso das embalagens plásticas, todos sabem que a resposta é a economia circular, o que não se resume a um slogan; é um mecanismo com engrenagens que funcionam em sincronia: Produção com design para reciclar; Descarte correto; logística reversa eficiente; Reciclagem em escala e com qualidade e; Consumo consistente da matéria-prima reciclada. Sem esta última, o mercado que compra e usa materiais reciclados é prejudicado. Quando esse mecanismo gira de forma estável, a demanda por insumos fósseis naturalmente diminui.

O problema é que conjunturas econômicas travam essa revolução. Petróleo barato torna a resina virgem mais atraente; de imediato, surgem atalhos: plantar árvores, comprar créditos de reciclagem ou ostentar selos de logística reversa que, isolados, pouco alteram a realidade do material no pós-consumo. Esses instrumentos podem ter papel complementar: financiamento, compensação, transição. Mas quando substituem o uso efetivo de matéria-prima reciclada, acabam por induzir o consumidor ao erro com um falso “missão cumprida”.

Mas chegamos na questão principal: utilizar matéria-prima reciclada é a única forma de fomentar de verdade toda a cadeia. É a combinação de preço e de volume que financia a coleta e a triagem, profissionaliza cooperativas, impulsiona a tecnologia e estabiliza a oferta.

Narrativas contrárias frequentemente buscam proteger materiais com baixa reciclabilidade ou conferir a eles um falso verniz de nobreza. Em alguns casos, opta-se por ações assistencialistas junto à base da cadeia em vez de investimentos estruturais em embalagens de fato recicláveis e recicladas.

O que fazer agora?

Negociar é conciliar ritmo e direção. A direção, todos conhecem: menos poluição, mais circularidade, menos dependência de fósseis. Já o ritmo não pode ser o da estagnação. Se a comunidade internacional não consegue, por ora, resolver tudo, que resolva o possível e já. Cada mês de paralisia fortalece a resina virgem barata, enfraquece o reciclado e mina a confiança social.

De fato, devemos estipular metas nacionais de coleta e reciclagem, padrões mínimos de reciclabilidade por categoria, rastreabilidade e transparência de dados, além de regras claras para logística reversa atribuindo responsabilidade a todos os atores do mercado.

A demanda garantida por reciclado é uma opção. Com metas obrigatórias de conteúdo reciclado (PCR) em embalagens. Já em Eco modulação e design, taxas e incentivos que tornem mais caro colocar no mercado o que não é reciclável e mais barato o que cumpre os critérios.

A blindagem contra greenwashing também é uma ferramenta. Limitar créditos e selos a um papel complementar, com verificação independente e proibição explícita de substituírem metas de uso de reciclado.

A luta contra a poluição plástica não fracassa por falta de solução, mas por falta de decisão. É hora de assinar o que já é consenso e tirar o resto do acostamento. (ecodebate)

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