Reduzir
o aquecimento global requer esforço sem precedentes, diz ONU.
Relatório
do IPCC alerta para a urgência de tomar medidas para reduzir 45% das emissões
de carbono em pouco mais de dez anos e evitar aquecimento acima de 1,5ºC.
Cenas
de seca como essa podem ser cada vez mais comuns no final do século.
Enquanto
o Brasil começava a conhecer alguns de seus novos governantes em 07/10/18 na
Coreia do Sul, uma reunião com cientistas e autoridades de diversos países
ligadas à ONU divulgou notícias que dizem respeito a todos os brasileiros, e
demais habitantes do planeta, embora poucos se deem conta.
O
Acordo de Paris, assinado em 2015 na Convenção das Nações Unidas sobre Mudanças
do Clima, traçou os objetivos a serem atingidos pelas nações para evitar que o
aquecimento global chegue ao final do século abaixo dos 2°C, com uma meta ideal
de 1,5°C.
Em
seguida, encomendou ao Painel
Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas (IPCC) um estudo que
colocasse em números o desafio de atingir a meta, e as possíveis consequências
de não fazê-lo. São milhares de cientistas trabalhando de forma colaborativa,
analisando os mesmos conjuntos de dados e estudos, para chegar a um consenso.
Um trabalho de anos para chegar aos resultados divulgados na manhã coreana e
eles não é muito animador.
“Uma
das principais mensagens que saem deste relatório é que já estamos vendo as
consequências de 1°C de aquecimento global através de condições climáticas mais
extremas, aumento do nível do mar e diminuição do gelo do Ártico, entre outras
mudanças", disse Panmao Zhai, copresidente do Grupo de Trabalho do IPCC I.
Vamos
começar pelas boas notícias: é possível atingir a meta. Se começarmos a reduzir
drasticamente a emissão de dióxido de carbono, o CO2, até zerar por
volta de 2050, e de outros gases, como metano, talvez consigamos impedir que a
temperatura global ultrapasse 1,5°C. Mas quando reduzir drasticamente não é
força de expressão. Com 45% do corte já até 2030.
O
problema é que estamos muito aquém do necessário. Se as emissões continuarem do
jeito que estão, chegaremos a 1,5°C em 2040. Mesmo se atingidos os objetivos
das nações individualmente com o Acordo de Paris, que no caso do Brasil é de
reduzir 37% das emissões de carbono até 2025 e “possível” redução de 43% até
2030, chegamos ao ano 2100 acima dos 3°C.
Cientistas
afirmam que há ganhos em evitar que a Terra aqueça dois graus em relação ao
período pré-industrial.
Com
o aquecimento limitado em 1,5°C, o impacto será principalmente sentido pelas
populações mais pobres. A agricultura perde produtividade, acarretando aumento
dos preços dos alimentos, insegurança alimentar e fome. Fortes ondas de calor e
inundações costeiras podem obrigar deslocamentos de populações. Mais de 100
milhões de pessoas podem entrar para a pobreza. O número de pessoas
subnutridas no mundo poderia ser de 25 milhões a menos até o final do século do
que sob o aquecimento de 2°C.
"Todo
aquecimento importa, especialmente a partir de 1,5°C. Aumenta o risco associado
a mudanças duradouras ou irreversíveis, como a perda de alguns
ecossistemas", disse Hans-Otto Pörtner, copresidente do IPCC - grupo de
trabalho II.
Problemas
graves, mas que são possíveis de contornar. Basta que a humanidade queira. Mas,
se chegar a 2°C, aí não vai ter muito o se que fazer. Países que são compostos
por pequenas ilhas, como Tuvalu e Kiribati, vão desaparecer. A maioria das
ondas de calor vai provocar sérios impactos à sociedade, com mortes, incêndios
florestais e perdas de produção. Em países tropicais, como o Brasil, ondas de
calor vão ocupar pelo menos metade do verão.
Poluição
Limitar a elevação da temperatura a 1,5°C, em comparação com os 2°C, pode
prevenir cerca de 153 milhões de mortes prematuras por poluição do ar em todo o
mundo até 2100 - cerca de 40% das mortes nos próximos 40 anos. Esse é um
benefício tão grande que, em termos econômicos, pode até ser maior do que o
custo total de reduzir as emissões de carbono na maioria dos principais países
emissores.
À
medida que as temperaturas sobem, as áreas protegidas começam a desaparecer. Em
2°C, 25% das 80.000 espécies de plantas e animais nas áreas mais ricas do
mundo, como a Amazônia e Galápagos, podem enfrentar a extinção local até o
final do século. Temperaturas de aquecimento podem afetar o comportamento de
insetos e animais, causando um efeito cascata que afeta ecossistemas inteiros.
Sendo
isso só uma pequena parte de uma longa lista de consequências que não deixam
ninguém ileso. É preciso mudar, e agora, recomenda o IPCC. "Limitar o
aquecimento a 1,5°C é possível dentro das leis da química e da física, mas isso
exige mudanças sem precedentes", disse Jim Skea, copresidente do IPCC -
grupo de trabalho III.
Para
começar, o uso de combustível fóssil deve cair rapidamente. Principalmente o
carvão, que deve ser quase totalmente eliminado por volta de 2040. O uso de
petróleo também precisa cair ao longo do século.
Alcançar
o 1,5°C será muito mais fácil, mais barato e menos prejudicial se os governos
tomarem medidas imediatas para mudar para energia limpa. O investimento
contínuo em usinas de combustível fóssil significaria que futuros cortes teriam
que ser mais drásticos. Se a energia eólica e solar continuar crescendo entre
25% e 30% por ano até 2030, então pode começar a crescer mais devagar, de 4% a
5%. Assim, o setor de energia elétrica estaria completamente descarbonizado na
metade do século.
A
indústria, diretamente responsável por 21% das emissões globais, deve encontrar
meios de cortar suas emissões até 2050, e o transporte tem de passar a ser
elétrico. Se cerca de 70% dos veículos forem elétricos até 2050, as emissões
globais anuais de dióxido de carbono cairiam para o equivalente a cerca de 8%
das emissões totais atuais. Mas isso não basta. É preciso planejamento urbano,
de modo que diversas formas de transporte, como caminhada, bicicleta, trem,
bonde, ônibus, se integrem para atender de forma fácil o cidadão, além de
políticas públicas que desestimulem o uso do carro.
No prato
Nossa
comida também precisa mudar. O que as pessoas comem é um fator importante que
determina o estado da floresta e dos solos. A produção de carne, frutos do mar,
ovos e laticínios é responsável por quase 60% das emissões relacionadas aos
alimentos, apesar de contribuir com apenas 37% de proteína e 18% de calorias.
Quanto
mais carne, peixe, laticínios e ovos as pessoas comem, mais difícil será
limitar o aquecimento a 1,5°C. Mudar o hábito de comer mais de 100 gramas de
carne por dia para comer menos de 50 gramas pode reduzir as emissões da comida
de uma pessoa em 35%. Mudar para uma dieta vegetariana poderia reduzir as
emissões em 47%, e mudar para uma dieta vegana poderia reduzir as emissões em
60%.
Florestas
Proteger os ecossistemas e prevenir a destruição de florestas são formas
importantes de reduzir as emissões de carbono. O desmatamento deve ser zerado.
Como as árvores e plantas absorvem CO2, o plantio florestal em grande escala e
a restauração de ecossistemas danificados, como pântanos e mangues, também são
métodos potencialmente significativos de remover carbono da atmosfera e também
trazem muitos benefícios, incluindo filtração melhorada de água, proteção
contra inundações, saúde do solo e habitat da biodiversidade.
Atualmente
o solo libera mais gases de efeito estufa do que absorve, sendo responsável por
cerca de 24% das emissões. Alguns cientistas sugeriram que esse processo,
chamado de "Bioenergia com Captura e Armazenamento de Carbono"
(BECCS), poderia ser uma forma relativamente barata de remover o carbono da
atmosfera. Mas a tecnologia ainda está em fase de testes e o uso da BECCS em
larga escala pode ter sérias consequências para o uso da terra e da água doce,
a biodiversidade e o funcionamento dos sistemas naturais.
Passando
por diversos aspectos das nossas vidas, o relatório IPCC tem o objetivo de
servir de base para que governantes e idealizadores de políticas públicas pelo
planeta construam uma sociedade que vá ao encontro de uma economia com carbono
neutro. Uma medida urgente e inadiável, embora pensar nisso seja difícil na
noite em que o candidato à Presidência da República mais votado do primeiro
turno das eleições, com mais de 49 milhões de votos, Jair Bolsonaro (PSL),
declara abertamente sua intenção de acabar com o Ministério do Meio
Ambiente, fazendo uma fusão com o Ministério da Agricultura. (globo)
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